O POÇO QUE EU FIZ PRA MIM

Carlos Omar Villela Gomes

 

Cavei um poço pra mim

Que cobre além do pescoço;

É um poço velho, sem fim,

Maior que o mais fundo poço.

 

É um poço de encruzilhadas,

De solidões, labirintos,

Com cada metro escavado

Pelas tristezas que sinto.

 

É um poço que não tem água...

Tem sangue, sonhos, saudades;

É um poço ruim, de venenos,

Sugando em tragos extremos

Meu resto de humanidade.

 

É um poço que se apodera

Das rebeldias, retoços

Que forjei em outras eras

Nas ventanias de moço.

 

Não houve pedras, nem baldes,

Nem pás, nem escavadeiras...

Um poço infindo, covarde

Cavado pela ansiedade

Das minhas mãos prisioneiras.

 

Um poço de bebedeiras,

“Mata-ratos” fedorentos;

Cobrindo o céu das estrelas

Com tristes céus fumacentos.

 

Sou prisioneiro do poço,

Sugado em seus labirintos;

Coberto de chumbo grosso

E das verdades que minto.

 

Cada pedaço de espada,

Cada alma que magoei...

Cada paixão desbotada

Das chinas que não amei.

 

São esses tantos que afogam,

Brutais arrependimentos...

Tropilhas tristes, à soga

Na boca do poço imenso.

 

É desse poço que eu bebo,

Me regozijo, enveneno;

Todo calor que recebo

Se mostra turvo e pequeno.

 

Pois não enxergo uma nuvem

Pairando acima do poço;

Existem léguas de nada

Acima do meu pescoço.

 

Não sou homem que se gava

E nem me acho um colosso;

Mas sou mágico macabro;

Pois fiz de mera garrafa

O mais profundo dos poços.

 

Mas certa feita, perdido

Nos labirintos viciados,

Alguém jogou uma corda

Que eu peguei, desesperado.

 

Assim, então, fui puxado

Pra fora da escuridão;

Pra fora dos labirintos

Que cavoquei com minhas mãos.

 

Abri meus olhos soturnos,

Limpei os tantos venenos

E vi que o mundo era imenso

Frente aos meus olhos pequenos.

 

Vi cores, vi liberdade,

Tive águas boas, imagens

E chuvas de bem viver;

E eu, entregue, já morto

Fui resgatado do oco

Do poço do mal querer.

 

Pois da outra ponta da corda,

Alguém lutou até o fim...

Com toda sua força e gosto

O amor mostrou-me o oposto

Do poço que eu fiz pra mim.