SOB OS SÓIS DE SETEMBRO
Nenito Sarturi
No lombo de um flete mouro
Que até parece voejar
No pastiçal de flexilias
Revisito, em pensamento,
Paisagens verdes, coxilhas,
Várzeas, peráus e alagados
Da velha e boa Querência
É o dom da imaginação
Que, novamente, me salva
Das muralhas de cimento
Onde aprisionei, sedento,
o velho corpo ofegante.
Só o Velho corpo, repito,
Porque a alma, que é andante,
Freqüentemente se solta
Nas asas livres de um grito
E, ao tranco do pingo mouro
Bueno de pata - um irmão
Que também sente as agruras -
Vou beber céus e lonjuras
Nas aguadas do meu chão.
Sob os sóis deste setembro
De lembranças sanguinárias
devagarito relembro
Figuras tantas, lendárias,
Que povoaram sesmarias
Peleando em hostes contrárias.
Páginas inapagadas
Que ficaram registradas
nos anais da tantas glórias.
Tempo de luta, vitórias
Que refulgem mais ainda
Quando os antigos revivem
Das cinzas, pela memória,
As brasas da nossa História
Que nunca damos por finda
Contemplo um Bento Gonçalves,
Um Neto - a força terrunha,
Um taura que a lança empunha
Com honra e com altivez ...
Heróis sem voz e sem vez
Que orgulharam os seus pares,
Mas deixaram tantos lares
Na orfandade e na viuvez
E, nos sóis deste setembro
que não se apagam jamais,
Resplandecem Canabarros,
Garibaldis, tantos mais,
Que os pais dos pais de maus pais
Souberam glorificar.
A nós, não cabe julgar
Os atos dos ancestrais:
Apenas reverenciar,
Já que tombaram peleando
Sob o manto de um ideal
Por um Rio Grande imortal
Que continuamos cultuando.
Hoje são outras armas
- Nem adagas, nem fuzis -
Existem tantos “Brasis”
Da ponta ao coice do mapa.
E há uma vanguarda guapa
Que desbrava, intransigente,
Este Pais - continente
Leste a Oeste, Sul a Norte
Campeando sua própria sorte
Com a velha fibra farrapa.
Por isso, irmãos brasileiros,
Não nos olhem com surpresa,
Já que o pão que vem a mesa
É fruto desse labor ...
Saibam, também, que o amor
Que nos impele na lida
É que nos faz recolhida
E nos atiça o fervor
De defender com a vida
O pavilhão tricolor.
Mas virão muitos setembros
Após cessar a fumaça.
E a mesma fibra da raça
Há de fazer reculuta,
Impulsionando a disputa
Que conhecemos de cor,
Onde o trabalho e o suor
Darão razões à labuta
Na brava e eterna luta
Por um Rio Grande melhor.