ROMANCE DO AMOR FRUSTRADO.
Ibani Jorge Bicca
Quem passa tarde da noite
na taipa daquele açude,
escuta um gemido triste
entre soluços de dor,
de alguem que morreu sofrendo
por perder seu grande amor.
Antonio era o capataz
daquela bela fazenda,
e um dia chegou do povo,
trazendo um piá nos bastos.
Boleou a perna dizendo:
- Com licença meu Senhor,
mas eu trouxe este menino,
pois a mãe dele a Judite
lá, das casas de perdição,
morreu jurando pra todos
que ele é meu filho, patrão!
Tinha o guri, quatro anos.
Zé Pedro, era seu nome.
Tinha um olhar de tristeza,
de quem já nasceu sofrendo...
Antes que o patrão falasse
a patroa foi dizendo:
- A gente ajuda a criar.
As criadas tomam conta...
O inocente não tem culpa
por ser pialado da sorte.
Antonio, emocionado,
disse, obrigado patroa,
Deus lhe pague, lá do céu,
por ter a alma tão boa!
Assim o píá foi crescendo,
mascote da peonada.
Esperto, ladino, atento,
ia aprendendo de tudo,
mas sempre respeitador.
Educado e prestativo,
todos lhe queriam bem.
Mas a sorte, sua madrasta,
Que já levara sua mãe,
Levou o seu pai também!
Era um dia de rodeio,
de marcação campo a fora.
Quando um boi se desgarrou,
Antonio deu alce ao baio,
ligeiro que nem um raio
parecia que voava
e quando o boi alcançava,
achou buraco e rodou.
Antonio que nas rodadas
abria a perna e saía,
la fresca! pois nesse dia,
ninguém entende porque,
pescoço quebrado, inerte,
ficou embaixo do baio.
Órfão de mãe e de pai,
Zé Pedro, nos olhos tristes
refletia toda a mágoa
de ter ficado solito
com sua sorte madrasta.
Menos mal que a patroa,
bondosa e dedicada
olhou pelo piazote triste,
pra que não faltasse nada.
Crescendo e trabalhando
Zé Pedro, acompanhava
o crescimento também
da filhinha dos Patrões,
sempre atencioso e dedicado
respeitador, educado
e muito trabalhador.
Sarita, a filha do seu patrão,
era dois anos mais moça...
E que graça de prendinha.
Alegre, brejeira e linda
Tinha em seus olhos azuis
todo o frescor das manhãs!
Madeixas de caracóis,
esvoaçavam ao sol,
com o brilho dos trigais!
Crianças, Zé pedro e Sarita
brincavam de faz-de-conta!
Mocitos bricavam de namorados!
Brincavam,...mas ficou séria
A bincadira dos dois.
Pois quando se deram conta,
estavam apaixonados
com juras de eterno amor.
Certo dia de tardinha,
quando voltava da lida,
Zé pedro encontrou em seu catre
um bilhete de despedida:
- Meu amor fui pra cidade,
que chamam de capital...
Meus pais querem que eu estude.
Tentei ficar, mas não pude.
Nas féria, eu vou voltar.
Moço guapo, Zé pedro
tornou-se o braço direito
do seu patrão na fazenda,
que desde a morte do pai,
ficara sem capataz.
Sempre esperando Sarita
Quando voltava de férias
para a saudade matar,
O moço foi trabalhando
sem pensar em seu futuro,
Como todo o mundo faz.
Todos anos no verão,
Quando Sarita voltava
Seu coração exultava
apaixonado no mais...
e a paixão dos dois crescia,
mesmo assim ninguém sabia
daquela louca paixão,
pois pai e mãe de Sarita
Viam Zé Pedro pra ela,
Como uma espécie de irmão.
Depois de muitos verões,
eis que Sarita não veio
Quando Dezembro chegou.
Indagando da patroa,
Zé Pedro teve a resposta:
- Sarita foi pro estrangeiro,
Completar os seus estudos,
volta no fim do verão,
para assumir a fazenda
e lhe quer como capataz!
Triste pela longa espera,
mas por outro lado contente,
com a volta definitiva
Zé pedro contava os dias
para o regresso da amada.
Sonhava com seu sorriso,
com seu os olhos faceiros,
lindos pedaços de céu!
Com sua pele macia,
cheirando a manjericão.
- Zé Pedro, pega a charrete
e vai logo pra estação,
que a sarita chega hoje
com o trem do meio dia.
Com a alegria estampada
naquele rosto de peão,
fez o trajeto a galope
da estancia até a estação
E o coração parecia,
que ia saltar do peito,
quando viu o trem minuano
apitar fazendo a curva
para chegar na estação.
Mas quando desceu Sarita,
Braços dados com um gringo,
seu coração quase parou!
O olhar de menino triste,
marejado de tristeza,
veio de novo morar
no alto de seu semblante.
Quando ela lhe apresentou:
- Peter, este é meu empregado!
Zé Pedro, este moço forasteiro,
é Peter, meu namorado!
Da estação pra fazenda,
Ze Pedro conteve o pranto,
Vendo o enlêvo dos dois
ao seu lado na charrete,
falando, "ai love iu".
Desceu as malas dos dois
quando chegou na fazenda,
saltou no lombo do zaino
e se foi no rumo da venda,
comprou um naco de fumo,
e uma garrafa de canha,
depois voltou pro galpão,
passou a mão num caniço
e saiu direito ao açude.
Sentou na beira da taipa
com os dois pés dentro d'água
largou o caniço de lado
Fechou um grosso palheiro
e destampou a garrafa...
A canha descia ardendo
mas esquentava seu peito.
Olhando o céu e bebendo,
Cabeça baixa fumando,
fitando a água do açude,
A dor foi adormecendo.
Fitando a água do açude,
não via grama boieira
nem enxergava aguapés...
Seus olhos viam lembranças
dos seus tempos de criança
e de tudo o que ele passou.
A canha descia ardendo,
E a dor foi adormecendo...
E viu Sarita tão linda
Sorrindo pra ele ainda,
dentro da água do açude,
sorrindo como um convite:
Vem meu amor, ser feliz....
Três dias depois, acharam
o corpo dele boiando
bem na beirinha da taipa...
Tinha no rosto um sorriso...
Mas nos seus olhos havia,
o mesmo olhar de tristeza,
de quem já nasceu sofrendo!!