O SONETO PELOS QUATRO ELEMENTOS

Autor: Rodrigo Bauer


I

Eu sinto no soneto algo de etéreo,
um sopro de magia em movimento...
É o ar que se transmuda e faz-se vento
varrendo meridianos e hemisférios!

O ar que me sustenta, à revelia
da lei da gravidade carcereira,
me empresta um par de asas passageiras,
que abro pra voar na poesia!

Eu sinto o ar na pele, quando venta
e então, misto de brisa e de tormenta,
eu fujo sem vontade de voltar...

E, envolto na distância e no mistério,
eu sinto no soneto algo de etéreo...
Eu sinto que o soneto está no ár!

II

Com as mãos escavo a terra
e dela brota a essência do soneto, que dormia,
com ela a solidão da poesia,
perdida numa terra tão remota!

Replanto os seus pendões de encantamento,
regando com o olhar emocionado
um sonho que restava soterrado
num solo de aridez e esquecimento!

Enfim, frente aos meus olhos incontidos,
rebrotam as palavras e o sentido
que une, que combina e que se encerra...

E, pleno de esperança e de fartura,
olhando o horizonte na lonjura,
eu vejo que o soneto está na terra!


III

A vida é um velho rio em piracema,
o olhar é uma vertente que não cansa
e irriga este soneto de lembranças
na lágrima que cai sobre o poema!

Poema que deságua no oceano,
sacia a minha sede, enquanto moço;
e, velho, faz exilio dentre o poço
que guarda solidões e desenganos...

Chovendo nos quartetos e tercetos,
hidrata a tessitura do soneto,
lavando as cicatrizes dessas mágoas...

Assim, solidifico e evaporo
e, insípido, incolor e inodoro,
afirmo que o soneto está na água!

IV

Ateio a chama velha da saudade,
macia e elegante como a seda
que, em pouco, já se torna labareda
e aclara o que carece de verdade!

Acende o meu soneto que era escuro,
encontra a rima certa, o termo exato
e aquece todo o frio do meu recato
pra ter um verso quente, um verso puro!

Do fogo vão surgindo o sol, a lava;
e tudo que, horas antes, tiritava
faz parte dessa sina e desse jogo...

E, súbito de chamas e alegrias,
acendo para sempre a luz do dia
e grito que o soneto está no fogo!