NO BAILE

Ruth Farias Larré

 

São muitos dias de espera,

ansiedade, fantasia.

O sonho desata, louco,

a inventar mil quimeras.

Ai, que encontro majestoso!

Sim, o príncipe virá!

 

E, nos seus braços galantes,

ao rodopio das valsas,

ao embalo das milongas,

seus olhos terão fagulhas,

seu peito, uma labareda.

E a voz, juntinho da orelha,

cadenciada e aquecida,

será poema e canção.

 

Enfim, o dia é chegado!

Um dia todo alvoroço.

É vestido, é o sapato,

a meia, o laço de fita,

a pintura para o rosto,

o lápis de sobrancelha,

água-de-cheiro, batom.

 

“Ai, meu cabelo ta feio!

Tem que ter brilho de seda,

tem que ter cheiro de flor!

Ainda não sei quem é ele,

mas sei que vou encontrar!

Eu tenho que estar bonita,

bonita de apaixonar!”

 

“Vamos, filha, ta na hora,

o baile vai começar”

“Vou indo, mãe! Ai, meus brincos!

Me ajuda, mãe! Tô bonita?

Quem sabe troco o vestido?

Quem sabe desato a fita?

Será que vão me tirar?”

 

No salão, muitos já dançam.

A música transporta os pares

pras veredas do prazer.

“Tô aqui faz quase um ano!

Ninguém me vê, Deus do céu!

Se não for meu soberano,

que venha um cristão qualquer”

 

“Também! Por que eu não posso?

Por que é dele o poder?

Por que é que só o homem

tem o direito de escolher?

Tem mesmo que ser assim?

Queria eu ver um rosto,

um olhar que me agradasse,

e ir busca-lo pra mim”.

 

Enquanto esse davaneio

atordoa o coração,

alguém para à sua frente

e convida para dançar.

“Não era esse o do sonho,

mas tem passos ritmados

e um jeito bom de abraçar.”

 

De repente, dá-se conta:

que bom ter sido escolhida,

que bom não ter que buscar!

“Que ele venha e eu decida

com quem me agrada ficar.

Não quero sofrer repúdio.

Seja ele a se arriscar!”

 

“Enquanto não vens, meu príncipe,

o meu sonho te recria.

E se alvoroçam as asas

dessa doida fantasia.”

 

“Que o coração se exaspere,

que se machuque na espera,

nos enganos e nas ânsias.

Mas que me escolham nos bailes!

A mim, na dança, me cabe,

ao som de xote ou bolero,

selecionar o parceiro

e decidir: este eu quero!”