NA FLOR DA PELE

Adriano Alves

 

Tenho uma marca estampada “a flor da pele”

Que me difere sem saber dos meus iguais...

 

Tenho essa marca porque já fui índio...

 

E vivi um tempo que pensei liberto;

Compreendi dos ventos seus idiomas tantos

Evoquei num canto meus ‘Pajés’ guerreiros,

Que me deram bênçãos de sereno e lua...

 

Tive nas mãos o “olhar” da lança nua

E na voz um grito de vida e esperança...

 

Mas calei a voz,

Pois não se ouviu meu grito...

Vi tombar a lança,

Mesmo tendo a vida...

Conheci o escuro, e falsas esperanças,

Quando abri os olhos e olhei pra cruz...

 

Tenho essa marca porque já fui negro...

 

E plantei meus sonhos muito além dos mares

Onde meus antigos eram seus senhores;

Com seus tambores convocando as forças

De muitos sóis, pra os ‘Orixás’ seus Deuses...

 

Tive em meus braços, mais que a própria força.

E nas mãos judiadas, mais que a dor dos calos...

 

Mas faltaram-me as forças,

Quando uni meus braços...

E nas mãos os calos,

Judiaram mais, quando encontraram a alma...

Pela dor da angústia, em pesadas correntes,

Que fecharam meus olhos, sem ter uma cruz...

  

Tenho essa marca porque já fui pobre...

 

E vivi sem nome, sem respeito e pão.

E antes de mim outros tantos, perdidos pelo caminho,

Viveram também sozinhos, mesmo com muitos a volta,

Contando os dias sem saber futuro, pelas mãos da sorte...

  

Tive em meu rosto, as feições de algum desprezo;

E na garganta, o gosto amargo do silêncio...

 

Mas soube o desprezo

Quando mostrei meu rosto...

E provei o silêncio

Pelo amargo na garganta...

Nas feições o gosto pelo sal da lágrima;

Quando ergui os olhos, frente a quem morreu na cruz...

 

Tenho essa marca porque fui menino...

Porque nasci índio, porque cresci negro,

Porque vivi pobre, sem respeito e pão.

E encontrei abrigo sob o céu das ruas

Sem saber carinhos, no olhar frio de tantos...

 

Tive em meus olhos a inocência humilde

E pureza, viva junto ao meu sorriso...

 

Mas perdi dos olhos

Mais que a viva inocência...

E a pureza

Disse adeus a meu sorriso...

Quando nas ruas, sob o frio olhar de tantos.

Sobre meus ombros, o destino ergueu sua cruz...

 

Tenho uma marca estampada “à flor da pele”,

Que me difere sem saber dos meus iguais...