Loucos Mansos

Silvio Genro

Dizem que ficou anssim,
Duma rodada mui feia...

 

Mas ninguém sabe, de fato
o que deixou o Torquato
Meio tãn-tãn das idéia.
Desde então,

Era ele quem fazia

a alegria da peonada


nas rodas de chimarrão.

 

Era um desses,

"Loucos mansos",

Que todo mundo quer bem...

Que adoçam as nossas vidas,

Nos deixam menos sofridos

E mais humanos, também

 

Mas a piazada zombava

E a gauchada se ria

Quando o Torquato dizia:

 

"... QUE AS ROSETAS DAS ESPORAS

VIRAVAM ESTRELAS CADENTES

RISCANDO A NOITE SILENTE,

QUANDO UM GINETE MORRIA!"

 

E bueno...

Quem iria dar razão
A esses tipos que têm

O dom de olharern o mundo
-Meio de ponta cabeça-
Segundo a sua visão?

 

Mas nada encantava mais

A alma boa do Torquato

Que os causos de gineteadas,

Com cenas de gauchadas

Enfeitando seus relatos...

Daqueles, flor de ginetes,

Que outrora fizeram fama
-Suas façanhas e dramas-

Que emocionavam a gente.

 

"De quando, uma certa feita,
o finado Adão Castelhano,
Tirô as cosca dum zaino

Que ninguém parava em cima!
Ou então, daquele dia

Que o velho Adão Segóvia
Salvô o neto do Candinho
Do lombo dum gateadinho,
Agarrado pelas clina!"

 

E a voz do louco Torquato
Numa linguagem simplória,
Reavivava nas memórias
A história desses ginetes:

 

O ginete João Maria...
Finado Chico Salgueiro,
Que morreu num entrevero
Na Capela do Ipané!

Quem se alembra dum ginete
De apelido Cabo Afonso,
Que se afogou inda moco
No Passo do Carumbé?

 

O mulato Xirú Souza...
Dona Catala da Rosa,
- Êta, muié caprichosa

Na doma dos semoventes!

Um tal de Pedro Clemente...
O famoso Zeca Coruja...
E os irmão Azambuja,

Dois ginetes destemidos
Que morreram esquecidos

Num asilo do Alegrete!

 

E assim seguia o Torquato,
Floreando suas historias,
Contando feitos e glórias
De ginetes e baguais...
Numa singela homenagem
Ao pago e seus personagens,
Que se não fosse seus causos,
Já ninguém lembrava mais.

 

Lembrar? Inté lembrariam...

Mas, quem acreditaria

No fato que eu conto agora

E lhes juro que aconteceu!

"QUE AS ROSETAS DAS ESPORAS
VIRARAM ESTRELAS CADENTES
RISCANDO A NOITE SILENTE,
QUANDO O TORQUATO MORREU".