IMAGENS

Adair de Freitas

 

 

Quando refugo meu catre,

cedito, que ainda não é dia nem noite,

da porta do galpão encho minh'alma

na paz que me transmite a calma

da imensidão da pampa.

Do olhar do guacho que levanta, espreguiçando,

da faceirice do meu cusco, abanando a cola.

Do canto do galo, primeiro a ver a aurora, repechando

as últimas dobras da coxilha, onde se acampa.

 

Esta semana me toca a recolher.

Total é a vida campesina do peão.

Prender o fogo no galpão,

arrimar cambonas para o mate,

enfrenar o sogueiro e trazer pra mangueira,

a muda de pingos iguais de pêlo e marca.

Pois não tarda o alvoroço da peonada buena

pra mais um dia de trabalho assinalar em sua tarca

de vida e lida nas estâncias da fronteira.

 

Buenos dias, meus senhores!

Buenos dias, respondem os da mateada, ao que chegou!

Mateiam e o ronco da cuia

é o único som que desperta o chiru

do fascínio que provocam as labardas,

repontando o pensamento a corredores longos

onde uma ponta de saudade vai tranqueando solta,

rumo à querência de um querer que aos tombos

vai se domando nesta ausência tão alpeda.

Uma costela gorda, uma paleta

respingando graxa no brasedo.

Consumo escolhido a dedo, no rebanho do patrão.

Esperam campeiros que encilham seus ruanos.

A manhã se torna grande para quem madruga

e o índio precisa estar bem puchereado,

pois mete os encontros e nunca refuga

e a carne da ovelha reforça o tutano.

 

Num de repente chega o capataz

e cumprimenta, dizendo: - Vamo pegá, moçada!

E como é lindo ouvir e nos agrada

o ruído dos tiradores, o tilintar de esporas

rumo aos fletes que relincham.

Eles sabem, companheiros do homem da campanha

que chegou em que a faina recomeça

e se domados foram, perderam as manhas.

Trabalham mano a mano e nunca se queixam.

 

 

E lá vão eles, cavalos e homens.

Campeiros, tranqueando, trocando orelhas, proseando.

Assim cruzam o potreiro, pacholeando, rumo ao posto.

Há muito o que fazer, estância grande e bem povoada.

Gado de cria, novilhada gorda, bois de tropa.

Rebanhos de velhas, branqueando o verde pasto.

Manada de crioulos que seguindo o garanhão, galopa

num tropel surdo, bem pra o fundo da invernada.

 

E quando voltam, homens e cavalos,

cansados, latem os cachorros festejando a volta.

As garras encilham velhos cavaletes

e os fletes, lombo lavado, se vão ao potreiro

e junto a peonada pra o banho de sanga.

O caseiro já tem as cambonas chiando,

pois sabe que a lida do peão não é a changa

e o mate é o que mata o torpor do campeiro.

 

Ah! Essas imagens da campanha,

puras, naturais, tão expressivas em sua singelez

nos fazem transbordar a alma de esperança

num tempo novo, para as novas gerações.

No claro alvorecer dessas querências

que há de fazer este Rio Grande, mais Rio Grande

e colocar à luz do sol, nossas conciências

e a igualdade em nossos corações.