DO IMIGRANTE, EM VERSOS

Danilo Kuhn

Os braços fortes regendo a lavoura,

agora a enxada é a sua batuta.

Música da terra, nova labuta.

Sementes notadas na partitura...

 

A clave de sol forte contra a fronte

e labor desde os clarins da alvorada.

Enquanto a plantação é orquestrada,

o passado renasce no horizonte...

 

Foi maestro de voz e de instrumento,

compositor de silêncio e de som,

mas a vida também muda de tom...

Impõe ao imigrante outro sustento.

 

Alegre nunca fora sua música...

Ânsia de vislumbrar mundo melhor.

Febres sonoras de amargo sabor

em valsas, polcas, chotes ou mazurcas.

 

Tampouco agora haveria de ser...

Embora sua lavoura gere vida,

jamais calarão as vozes feridas

que soam coral da alma do ser.

 

Expulso de sua terra natal

pelas mãos graves da fome e da guerra,

a cada golpe de enxada na terra

relembra trincheiras de sangue e sal.

 

Nada tão dissonante quanto à guerra...!

A obra polifônica infernal.

Não há luta justa, livre de mal,

quando vidas inocentes encerra.

 

E o imigrante que sabe do mundo

seus temores e suas esperanças,

com sua música ainda criança,

garatujas melódicas profundas...

 

Mas mesmo com tanto e todo o talento

deixou a sinfonia inacabada...

Trocou sua batuta pela enxada

quando a sorte lançou a pauta ao vento.

 

E, maestro ainda ante o universo,

faz música da terra germinar

com tanto ardor que amanhã haverá

que se contar do imigrante, em versos.