JOÃO DAS FEIAS

Xavier Walter Fritsch

 

As feia trás as bonita”

Dizia o João num ditado.

Assim vivia o lasqueado

retocando as balzaquianas.

E nessa andança aragana

por bailantas e carreiras,

não tinha feia solteira

que não sonhasse com o João.

Com seu jeito bonachão,

atipado e pacholento,

atiçava os sentimentos

do chinaredo de então.

 

Com um instinto de avestruz,

de comer qualquer porqueira,

e uma ânsia fandangueira

picaneando o garrão,

virava o rei do salão,

sem refugar, se atracava

na primeira que se abria

e a cachorrada se ria

da cara larga do João.

Que, sem afrouxar o garrão,

com as feias se divertia.

 

Das tantas que o João já fez,

tem uma negra manca

na Estância da Salamanca

num dia de marcação.

 

A negrinha era um tição,

tinha um bafo de cachaça,

mas vinha rareando a caça,

todo mundo acasalado

sem se fazer de rogado,

ao canto da pomba rola,

o João sumiu com a crioula

na garupa do gateado.

 

De outra feita, num surungo,

tirou uma gringa faceira

que apesar de dançadeira,

a risada era um relincho.

Mais feia do que um capincho

com sarna braba no pelo.

Tendo a gaita por sinuelo,

na mala luz da bailanta,

fez o baile com a percanta,

sem ligar pra concorrência,

pois diz a voz da experiência:

china feia ninguém canta.

 

De a cavalo era um São Jorge,

sempre atrás de algum dragão,

engrossando o pelotão

das feias que ele alegrou.

Pelo pago se espalhou

a fama desse carancho.

Terror dos bailes de rancho,

parceiro das capivaras

de onde vinha aquela tara

de urubu no mês de agosto?

O louco não tinha gosto

e nem vergonha na cara.

 

Um dia o João se aquietou,

largou de mão das gurias,

dos bailes, das pulperias,

se arranchou com uma morena

linda de fala serena

e olhos claros transparentes,

como as águas das vertentes,

de uma beleza esquisita.

E o João que não facilita,

agora regenerado,

repete em tom debochado

que “as feia traz as bonita”.