RÉQUIEM AO PAJADOR
Vaine Darde
Eu não
direi de ti a ausência ardente,
A falta que
a guitarra ainda chora,
Ocaso que
ficou dentro da gente
Naquela
noite triste sem aurora.
Eu só direi
de ti a lira inquieta
Que o vento
vem tanger nas casuarinas,
O rio que,
em murmúrios, desatina
Pranteando
o pajador na pampa aberta.
Todo violão se fez um ataúde...
Mas ressuscitas dessa Arcádia morta
Pra pôr cadência nas sonatas rudes
Dos
que o destino não abriu a porta.
Pois te declamam, nos confins rurais,
O peão humilde pra ninar a prenda,
O piá gaúcho pra cantar legendas
E os cata-ventos pelos temporais...
Eu não
direi de ti o tom agreste
Da frase
simples mas enluarada
Porque, há
muito, tu já te fizeste
O mago
d’arte de fazer pajada.
Alguns
romeiros te acendem velas
Em rezas
xucras de vocabulário,
Outros se
tornam teus fiéis templários
Nas pulperias onde te revelas...
Teu canto tinha vozes de ‘cordeona,
A chama bailarina do lampião,
A água borbulhante da cambona
E esporas cochichando no galpão.
Cantor das aflições dos arrabaldes,
Em tua tessitura missioneira,
Sabias dos acordes das goteiras
Cantando o vendaval dentro das baldes.
Ninguém irá
herdar o teu idioma
- Rebanho
que só tu apascentavas -
Em cânticos
de bailes ou de domas
Detinhas o
domínio da palavra.
É sempre a
mesma história...
o mesmo
tema...
Blasfemo te
imitando o sortilégio
Chegando a
cometer o sacrilégio
De ter um
verso teu no meu poema.
E quando chove ausência nos meus olhos
Nas longas madrugadas da campanha,
Sozinho, co’a guitarra sobre o colo,
É sempre um verso teu que me acompanha.
Jamais existirá alguém igual,
Jamais alguém terá a tua pena,
Na eterna trajetória do poema
Nasceste para ser outro imortal!
A ausência
que deixaste é ilusória...
Não sei, se
por encanto ou por magia,
Agora, tu
também és poesia
Translúcida
em sonora trajetória.
Tamanha foi
a força do teu dom
Que, mesmo,
sendo a vida só um sopro...
Tu já não
necessitas ter um corpo
Porque és
mais um ser de luz e som.