MINHA POESIA
Vaine Darde
Minha poesia não tem brilho
De prata ou de cristal.
Não tem a pulsação dos sinos
Nem a vibração das taças...
Minha poesia é opaca, é
tosca.
E por ser de tabatinga e costaneira
É oca. Não vibra. Ecoa.
Meus versos não possuem tacitura
De violino ou violoncelo,
São rudes como os sons que o
campo canta
E tudo que traduzem são
relinchos,
Cochichos de casuarinas
E duetos de esporas no
contexto dos rodeios.
Partitura desvairada
Tangendo o arco do vento
Sobre as guitarras dos rios.
Meu poema não se encontra
Em recinto ou recital.
Indônito não aceita
A invernada dos livros
Não suporta viver preso
Na inércia do papel.
Meu poema é nômade
Transita pelo pampa
Em pelo sobre o lombo dos
cavalos
Murmura segredos de vertentes
Na rebeldia das sangas.
Seu idioma é de tormenta,
Aéreo e musical, na canção
dos cataventos;
Seu timbre é de rumo
Quebrando o espelho das águas
Marcando a pele dos rios.
Ah, a minha poesia é oreleana,
Não tem marca,
Nasce nos confins do Sul
campeiro,
E cresce guaxa nas extensas
sesmarias
Bebendo aurora no açude,
Timbrando ninhos no ocaso
Onde os cascos dos cavalos
Planam sobre as maçanilhas.
O meu verso ganha asas
Nas tormentas de setembro
E se vai bater nas portas,
Pedir pouso nos galpões
Para ser sonoridade
Nas vigílias das tertúlia
E rodar as madrugadas
No aconchego dos violões.
Meu verso grita nos ventos:
Voa, verga, vasa, viajando no
arvoredo
Violado de minuano
E, distante, vive perto
Dos que guardam território
E, de repente, sai de si
Para ser sublime arpejo,
Vendaval harmonizado
Forjando vozes nos foles.
Meu poema se derrama
Como rio que se acumula
Pra sair
fora do leito
Na vazão que faz a enchente.
E pega o rumo das vilas
E invade os vales da serra
Levando, no seu percurso
Os acordes da nascente.
E o que era só poesia
Rudemente concebida,
Se derrama nas goteiras
Das partituras das quinchas
Cantando chuvas nos ranchos;
Se faz murmúrio de china
Na intimidade do catre
E canta o pampa no cio
Dos cães uivando pra lua.
O que era só poesia sitiada
de estrelas
Vocabulário de luz
De candeeiro e pirilampo,
Se traduz no cancioneiro
Encantado de guitarra
E abre sendas nos ermos
Para amanhecer nas casas
E nos mates matinais,
Junto aos fogões de lenha,
Ser companhia dos peões
Em cada rádio de pilha.