LOUCO
Vaine Darde
Eles
me interditaram...
Afastaram-me
das domas,
Não
me deixam usar adaga,
Nem,
sequer, cuidar do fogo...
E
conspiram contra mim
Com
silêncio e solidão.
Pois
alegam, uns aos outros,
Que
me tornei perigoso
Desde
quando me encontraram
Conversando
com as ovelhas,
Desde
quando descobriram
Que
eu cultivo girassóis
Por
devoção às abelhas.
Dizem
que ando variando
Com
milongas circulares
Na
canção dos cata-ventos,
Que
fiquei de miolo mole
E
me desfiz das esporas
Por
ter pena dos cavalos...
Proibiram-me
transpor
Os
limites da porteira
Numa
espécie de desterro
Que
me exila na querência.
Mas,
eu sei que eles não sabem
Que
os olhos de quem sonha
Vêem
além dos horizontes...
Eles
dizem que sou louco
Porque
vago pela estância
Conferindo
cada ninho
Onde
os vôos eclodiram,
Fazendo
tenda do pala
Sobre
o topo das coxilhas
Pra
navegar nas estrelas
Nessas
noites de verão...
(Imagina
se soubessem que eu carrego,
nos
pessuêlos, uma colméia de versos...)
Mas
enquanto eles proseiam
Agrupados
no galpão,
Para
encantar meu silêncio
O
vento canta pra mim,
As
sangas cantam pra mim,
Os
grilos cantam pra mim.
Enquanto
eles, que se julgam certos,
Tomam
mates sonolentos
Com
a água da cacimba.
Eu,
numa cambona de açude,
Sorvo
a lua num porongo
E
povôo a solidão
Com
as ausências que me habitam.
Eu
embrulho a palavra
Numa
folha de papel
Onde
guardo traduções de ocasos e auroras,
Onde
exponho meu silencio
Com
zumbidos de abelha
E
confesso a ternura
Que
dedico aos que me odeiam.
Eu
trabalho mais que eles.
Sou
só um nas sesmarias
Pra
saber de cada flor,
Pra
saber de cada pássaro
Com
que o campo sinaliza
E
os outros não percebem...
Eles,
sequer, reparam
Quanto
sol de cada dia
Se
acumula nas laranjas,
Que
porção de lua cheia
Se
derrama em frenesi
Na
gestação da semente.
Eu,
sim, eu sou livre entre
o
campo e as estrelas,
Eu
sei todos os caminhos
que
a querência me revela
Porque
vivo além de mim
O
que a vida me concede.
Mas,
se louco é ser dono de si mesmo
E
saber que as laranjeiras
Choram
lagrimas de pétalas
Num
cio vertiginoso
De
excessiva floração,
É
ter consciência plena
Que
a loucura é a poesia
Que,
por não caber no peito,
Se
extravasa em dialetos
E
ilumina seus eleitos:
Então
eles estão certos:
Eu
sou mesmo perigoso,
Uma
ameaça constante
De
povoar o galpão
Com
guitarra e arco-íres,
E
abelha, e girassol.
Não
, não é a mim que eles temem
Porque
sabem inofensivo
O meu
delírio musical...
O
que eles não suportam
É
aceitar a realidade
De
um louco ser feliz.