Meu senhor dono da casa ...
A
dalva desperta o dia
Que
adormeceu na lagoa.
Os
seus olhos preguiçosos
Avermelhados
de sono,
Vão
demarcar os limites
Das
águas e do infinito,
Onde
um João grande, solito
Segura
o final de outono.
As
lágrimas do sereno
Brilham
nas hastes dos juncos,
Como
vidrilhos da noite
Que
perderam a razão.
Uma
marreca piadeira
Mistura
sinais de vida
Que
passam despercebidas
Entre
as flexilhas do chão.
Não
sei porque remontei
O
mesmo canto de outrora
Nos
acordes desta aurora
Sonorizando
a manhã,
Quando
a dalva escondida
Na
goela de uma cigarra,
Imitava
um contraponto
Como
o namoro das rãs.
Aqui
nasceu um costeiro,
Com
misto de pantaneiro
E
sangue do litoral ...
Não
tinha ponta difícil
E
sabia o chão que pisava
Desde
a caverna do uivo
Ao
canhadão do enterrado ...
Se
criou pelos banhados
Dos
costados da lagoa,
E
tinha aprendido o gosto
Com
seu avô ... já finado.
Quem
faz da noite seu mundo
Tem
os astros nos braseiros,
E o
cintilar do luzeiro
No
picumã de um tição.
Os
mates remontam causos
De
cada alma estradeira,
Mirando
a estrela boieira
Rondar
o fogo de chão.
Tudo
era seu, e não era
Se
pra servir um vivente.
O
Gica era diferente
De
tudo o que já se viu,
Pra
ele a vida era a farra
De
uma carpeta de truco,
E o
resto ... é resto e dá lucro
Nos
bailes de rancheirio.
Por
muitas vezes tentei
Ser
um ás neste baralho,
Onde
a manilha de espada
Esquenta
as costas de um rei.
Mas
entrava nas apostas
Sempre
de rédea aparada,
E
eram cartas marcadas
As
flores que não cantei.
Croaldo
Souza Amaral,
Lembra
dele? ... ah! Se lembro
Lá
pelo fim de dezembro
Quando
o natal vai-se embora,
Se
ouvia o som de uma viola
No
compasso de um lagüero,
E
um “tipi”, alto e campeiro
Levando
a noite pra fora.
Não
era um terno de reis
Se
o Gica não viesse junto.
Dava
gosto de se ver
Em
desafio contra os grilos,
Cada
um no seu estilo,
No
seu modo de cantar.
- Porta aberta, luz acesa
...
“O
vovô Gica chegou”.
Entrava
rumo ao presépio
Pra
saudar Jesus nascido,
E
anunciar aos mais descrentes
Que
cristo estava presente,
Para
guiar seu rebanho
Como
havia prometido.
E
assim cruzou a querência
Anunciando
a boa nova
Qual
mensageiro de Deus.
Porém
o tempo velhaco
Às
vezes, sem mais nem menos,
Sem
usar qualquer critério,
Escolhe
o seu favorito.
E
numa destas o Gica
Foi
pego desprevenido ...
Mas
só cambiou de querência,
Ainda
é o mesmo gaúcho
Nas
sesmarias do céu.
Hoje,
quando esta lagoa
Se
encrespa num alvoroço,
É
ele dando um abraço
No
jardim do seu amor.
E
um novo terno de reis
Contraponteia
com os grilos
É o
Gica, o Jaime e o Rillo
Cantando um canto de flor.