QUANDO A VIDA COBRA SEU PREÇO

Paulo Ricardo Costa

 

Quando a vida perde o valor,
Até a alma se pára ausente...
E traz pra memória da gente,
Tantos ritos de crueldade,
Onde o ódio e a maldade...
Mancharam a baldes de sangue,
A história deste Rio Grande,
E a Praça de uma cidade;

Foi no dia dois de outubro,
Do ano de vinte e três...
Que a guerra mais uma vez,
Em barbárie e carnificina,
Deixou pela Pátria Sulina,
O que o tempo jamais apaga,
Uma matança, macabra...
De corpos pelas esquinas;

Até no telhado das casas...
Haviam homens armados,
Seiscentos índios, ferrados,
É o que a história me diz...
Contra uns oitenta, “infeliz”,
Valentes e de pura raça...
Entrincheirados na praça,
Da Velha São Chico de Assis;

E a bala “zunindo frouxo”
Descabelando as aroeiras,
O que era, posto e trincheira,
Aos pouquitos foi mudando,
Com os Pica-paus, recuando,
Por entre corpos tombados,
E os chimangos do outro lado,
Um anel de fogo se fechando;

Nestes rasgos de bravura...
Gritos, ameaças e lamentos,
Delírios e arrebatamentos,
De uma peleia feroz...
Às vezes faltava a voz,
Para os comandos de campo,
E tinha o ferro do aço branco,
Na solicitude de um algoz;

Pelo consumo das horas,
A coisa já vinha mal...
Com o combate, desigual,
Foi calando a resistência,
Numa sala da Intendência,
Entregaram-se os combatentes,
Meia dúzia de valentes...
Implorando paz e clemência;

Pois muito foi a desgraça,
Das centenas que tombaram,
E até hoje não explicaram...
De que valeu a matança,
E o que restou de herança,
Além de cruzes, sem nome,
Só a crueldade dos homens,
Que pelo tempo se avança;

Não vi nada de diferente,
Pelos anais da história...
A não ser a eterna glórias,
De facínoras, infiéis...
Que se esconde nos quartéis,
Alheia a própria situação,
De um irmão matar irmão,
Dando estrelato à Coronéis;

Até hoje o povo sofre...
As conseqüências da guerra,
Pois a vida não se encerra,
Quando um corpo é tombado,
Cada um já traz marcado...
Os seus dias de existência,
Deixando a dor da consciência,
Pra um dia, serem cobrados;

Por isso há tanta injustiça,
Espalhada em cada canto,
Se há tanta dor e pranto...
Enquanto o tempo não passa,
Mãe chorando a desgraça,
De ver um filho tombado,
Quem sabe, sendo cobrado,
Pelas matanças da praça;