Centauro
Paulo de Freitas Mendonça

Quem morre com seu cavalo
Numa cruzada de cargas
Das cavalarias brutas,
Nass arrancadas de guerra
Mistura sangue com sangue.
Na terra, pele com pêlos
Trapos de pilchas e aperos

Encerra a luta, tão bruta.
Não vê mais guerra, nem terra
Pra haver reculuta a guerra.
Não vê irmão contra irmão,
Apenas um corredor
Vasto na imensidão...
Na planura do horizonte
Mescla de nuvem e flor.

Ausenta-se do tropél
De estalos de adaga e lança
Vai seguindo em trote manso
Na maciez da eternidade
Para a Querência de Deus

É o mesmo flete de antes.
-Os potros possuem almas
Da mesma forma que os homens
Possuem berços divinos,
Uma pastagem de nuvens,
Aguadas e descampados.

Maleva vida terrena
Que põe gaúchos na guerra
Por puro amor pela terra,
A lutar com todo entono...
-Põe pingos nas arrancadas
Por simples amor ao dono.

Quem morre com seu cavalo
Viveu com ele também,
Pois não se escolhe parada
Quando um amigo se tem

Nos tempos de paz, na estância
Sempre é o mesmo cavalo,
Haja sol ou tempo feio.
E o mesmo para o rodeio,
Pulperia ou pataquada,
Ou de levar pra carona
Uma china redomona
De uma bailanta ou ramada.
-Afinam-se homem e bicho
Numa postura de rei,
De um soberano do pampa
Que num galope se agranda.

Maleva vida terrena
Que dividiu terra e gentes
Idiomas, descendentes,
Ideais e interesses
Conflitando os semelhantes

Nada mais é como dantes,
Há artefatos de guerra
Manchando de sangue a terra
Matando homens e potros...

-Sangrando a honra da vida
Por um capricho ou comando.

Quem morre com seu cavalo
Nas arrancadas de guerra,
Mistura sangue com sangue.
Na terra, pele com pêlos,
Trapos de pilchas e aperos.

Transcende sem um galope
Levando apetrechos seus.
-Só vai tirar o chapéu
No sem potreiros do céu
E apeia diante de Deus.