A Árvore e as Pedras

Paulo de Freitas Mendonça

 

A árvore retorcida e torta assim nasceu 

lutou muito para vencer entre as pedras da ladeira.

Com tamanha pertinácia, mesmo encurvada, cresceu.

Venceu o duro da pedra, a inóspita ribanceira,

e as agruras do tempo onde a terra endureceu.

 

Um dia, a arvorezinha deprimida por ser torta,

xingou a todas as pedras sem agradecer à vida:

vocês são duras e frias, sem coração, estão mortas,

culpadas pela tortura de eu ser feia e contorcida.

Lutei com todas as forças, comigo ninguém s´importa. 

 

Olhem meu tronco choroso, divido e ambos sós.

ante ao rude desprezo, sou uma e pareço duas.

Cada galho retorcido todo repleto de nós

é o sofrimento regado por lágrimas, sóis e luas

de uma luta constante, solitária, entre vós.  

 

A árvore sussurrou: que louca minha intenção.

Falar com pedras do chão, descoradas, nada belas,

que nada sabem de vida, esporo, transpiração,

protoplasma, fitohormônio, nucleotídeo, lenticela, 

flor, semente, fotossíntese, pólen e mutação. 

 

Houve pausa e uma pedra com sua voz interior

quebrou o silêncio e disse: querida filha, o que pensas?

desconheces a família que te acolheu com amor,

que te adotou com carinho, sem ligar pras diferenças,

que te amparou com presteza, sem crer que terias flor. 

 

Verdade, não temos galhos, nem floração, é evidente,

mas um amor maternal desde a hora em que nascias.

Não lembras, naturalmente, eras ainda semente...

Gritavas desesperada no meio da ventania

Até que te seguramos, salvamos a ti somente. 

 

Foi grande tua latência e nossa paciência em tê-la,

juntamos a esparsa terra para ajudá-la na sorte

da tua germinação, pra então poder protegê-la

dos predadores, da chuva, do frio e do vento forte.

Nós te salvamos da morte, fomos luz, beijo e estrela. 

 

Tivemos delicadeza nas intempéries mais bravas, 

segurando alguma água a cada chuva em represa.

Fomos amparo e ternura quando tenra germinavas,

engolimos tuas lágrimas em teus prantos de tristeza,

quando em dias como hoje, tu simplesmente choravas. 

 

Ao cresceres dividida, duplo amor e dois dilemas.

Por teus caules, dupla dor, quando em si te contorcias.

Nos teus calos doloridos em teus feridos floemas,

choramos os teus problemas, sorrimos tuas alegrias,

sempre avistando poesias e em teus galhos, poemas. 

 

A árvore ouviu calada, nenhuma folha movia.

Um sentimento aflorou, que antes não tinha por elas.

Sentindo-se convencida, curvou-se, agradecida

as suas eternas tutoras. Fez carícia numa delas,

viu o amor que havia nelas, e que havendo amor, há vida.