ESTRELA DO PAGO

Paulo Sérgio Boita

    

      Bendita estrela, que brilha

      No céu do Rio Grande altaneiro

      O teu facho de luz, mensageiro

      É o candeeiro da coxilha

      É o cincerro da tropilha

      Que desgarrou do seu rumo

      É uma história, que resumo

      Numa charla de galpão

      Ao pé, do fogo-de-chão

      Solito a campear aprumo

 

      E nas horas de desolo

      Das infindas madrugadas

      Nas noites enluaradas

      É que busco, teu consolo

      E meu destino, busco pô-lo

      Sempre no teu caminho

      Pra nunca andar sozinho

      Nesta sina de andante

      Pra ter luz, pra seguir adiante

      De quem é dona do meu carinho

 

      Te vejo, ao findar sorungo

      Em que cheguei de carancho

      E pelas frinchas do rancho

      Ao dar de mão no porungo

      Sorvendo um amargo profundo

      Dos mais crioulos do pago

      Este mesmo, a que te trago

      Nesta payada singela

      Já que a cor que te faz bela

      É a que me deixa iluminado

 

      És a deusa do amor

      Vênus para os romanos

      E para os gregos, seus irmanos

      És Afrodite, a mesma flor

      E para nós, o teu valor

      Tu que és bela, qual'ma china

      É maior que se imagina

      Na própria mitologia

      Pois já estavas, aqui no dia

      Em que surgimos na campina

      Toda vez que a luz do dia

      Se entrevera com a noite

      Tu repontas, qual açoite

      Numa tosca liturgia

      E nesta epopéia bravia

      Que te reges desde outrora

      Tu se perdes, campo fora

      Nas lonjuras, no infinito

      Pra retornar, despassito

      Quando vem raiando a aurora

 

      E nesta sina altaneira

      De sentinela, sem luxo

      És cincerro do gaúcho

      Por toda a campanha inteira

      Te chamamos de Boieira

      Pelo Rio Grande altaneiro

      E te chamam, desde os primeiros

      Vênus, na astronomia

      Afrodite, na mitologia

      E D'alva, no mundo inteiro

 

      Desde o brado charrua

      Ao primeiro jesuíta

      Da catequese bendita

      Ao índio, na pampa nua

      Isto tudo se perpetua

      Nesta terra de gigantes

      Da expulsão dos bandeirantes

      Dos primeiros índios guapos

      Ao levante dos farrapos

      Nestes pagos verdejantes

 

      Pro centauro, foi luzeiro

      Pelos campos cisplatinos

      Ou pealando correntinos

      Como sempre, brasileiro

      Tendo o cerne missioneiro

      No fundo do coração

      Foi a paz, branco pendão

      Entre chimangos e maragatos

      E também, vestindo trapos

      Um bugre, changueando pão

 

      Tu sempre esteves presente

      Em nossa epopéia divina

      Em nossas peleias brasinas

      E entreveros, de muita gente

      E apenas se fez ausente

      Depois que alvorecia

      Ou antes do fim do dia

      Pois redemoinhava a lo léo

      Ou sesteava pelo céu

      Num pelego, de água fria

 

      E teu xucro fogonear

      Nesta querência de cima

      Se reflete, na retina

      Da chinoca, a te bombear

      E nas noites de luar

      Quando um romance se enlaça

      Entre a chinoca e o guasca

      Tendo uma nuvem por quincha

      Está a D'alva, por uma frincha

      Tão atenta, ao que se passa

 

      Estás, desde os alvores

      Nas plagas do índio guasca

      Desde cedo, fazendo praça

      Ao ouvir nossos clamores

      Deste rumo aos payadores

      E motivos pra compor

      Nesta declaração de amor

      Que brota meio sem jeito

      Do lado esquerdo do peito

      Deste humilde, payador