ENTRE A ENCOSTA DO CERRO E O BEIRAL DA LAGOA
Moisés S. Menezes
Do alto de si mesmo, senhor
de si...
o cerro guarda a lagoa
que se espraia vagarosamente...
entrelaçada ao vento
outras vezes se agita...
rebelada
aos gélidos açoites desse vento...
O chicotear contínuo desse
andarilho
de muitas vozes...
de tantas origens...
de outros tantos caminhos
descaminhos...
maltrata, maldiz, malversa
enruga, envelhece
o corpanzil do cerro.
A lagoa refresca-lhe
o corpo judiado
espargindo-se em neblina
sobre cicatrizes e feridas.
Jogando-se inteira
em ondulantes vagas,
liberta o cerro de inimigos vis,
que lhe encurtariam a vida...
Quando a noite tolda tudo e
todos...
a luz da lua protege os paredões
uma procissão de silhuetas
que fantasmagoreia
pelas sombras...
Estórias, causos, crenças que
habitam
as furnas do cerro
e os abissais da lagoa
ganhando forma e voz
pela boca dos assuntos
noite a dentro nas rondas...
Manoel Barros clama,
exclama, reclama, dói-se
como o romance da filha
e o quarentão Inácio
não antevê futuro
não vislumbra felicidade
Se voltasse hoje
saberia da capelinha...
cidade romance
quase Santa Margarida...
Estranhos anjos
pairando sobre o espelho d’agua
prenunciando que o cerro
virá desabar...
as coisas ruirão... é o fim.
falam bocas...ouvem ouvidos
enxergam olhos assustados...
Um “Ness”
gaudério
habita as profundezas
aterroriza passantes
pescadores.
Povoa pesadelos noturnos,
concede asas ao imaginário...
Uma noiva, silenciosa e
meiga,
passeia entre o cerro e a lagoa
embora o tempo andado
cada vez mais bela se mostra...
Antiga...sabe de tudo...
conhece todos
comoveu-se com a outra noiva
aquela que se foi...
viu Margarida escrever o bilhete...
guarda segredos de amor...
e outros tantos...
pelos anjos da lagoa é protegida.
Musa de poetas e cantadores
Guarda de contos e crenças
que alarma sonhos
e canções bonitas...
Conceição do Arroio,
languidamente
recostada ao cerro
radiosa resplendente
refletida na lagoa...