À MARGEM DA BIOGRAFIA DE PEDRO, UM DOMADOR

Moisés Silveira de Menezes

 


Se é pra falar de araganos

cavalos e homens gaúchos

Pedro era o nome, recordo

pedra Pedro, inquebrantável

das estórias noite adentro

daí talvez, Pedro quebra,

campeiro por dinastia

pouca seca nenhuma queixa

a fama correndo longe,

a vida dias iguais

quebrando queixo de ariscos

por ofício e competência.

 

Talvez ao largo entendesse

entre tombos e tirões

que os potros que amanunciava

vinham de longe no tempo

das mouras escaramuças

rebeldes filhos do vento

vinham dos fletes beduínos

seus ancestrais no deserto.

Flechas ágeis, olhos de águia

tormentas em quatro patas

redesenhando limites

nos mapas da Europa e Ásia.

 

Num rancho frente pra o leste

na encosta sul da coxilha

vivera sonhos, verdades

deslindas de amor e amadas.

Hoje em meandros a mente

entende à sombra do outono

que a estrada fora empedrada

por terrunhos vaticínios

convicções, crenças, credos

como fora futurado

chamando Pedro  ao que vinha

naquele ocaso de tarde.

 

Homem sem grandes pecados

na lembrança mais recente

sem recordar ter negado

uma vez sequer ao menos

porque razão ou motivo

herdara Pedro ao destino

um viver empedernido

naquele  ermo de campo.

Plata escassa e tão suada

 

duro laber, lida bruta

gastando o corpo no arreio

daquelas fúrias de crinas.

 

O tempo, senhor da vida

consome, refaz, desgasta.

Sobre pedra ergueu-se um templo

sobre Pedro pesa o tempo.

Coriscos voaram sonhos

no campo largo da ausência,

olhos ariscos na busca

daquele que tendo asas

liberou céus e pandorgas.

Desgarrado o potro novo

sumiu campo e tempo afora

virou nuvem, vento, pó.

 

Porém Pedro, mesmo pobre

mas pedra que não quebrava

vinha de vales e montes

vinha do tempo de um templo

mais consistente que pedra

lembrava Pedro, e primeiro

que mesmo tendo negado

três vezes o próprio mestre

condensou verbo e razão,

pastor de almas e homens

se fez pedra Pedro templo

caminhante, pregador.

 

Mas Pedro, agora, o posteiro

nenhuma vez, muito verbo

santo monge pecador

de templo xucro de estância

no intermédio das lides

entre o palheiro e o amargo

põe-se a cismar e conclui:

“Destino potro indomável

trovão que não coube rédeas

pavena que não se amansa

me fez pedra, Pedro quebra

peregrino de domador...”