UMA JANELA CHAMADA SAUDADE

Marco Antônio Dutra

 

Pelas ruas da cidade

Sigo ao tranquito e a esmo

Vejo passar de soslaio

aquele mundão de concreto

entre luzes multicores.

 

Me adentro mais pra esse mundo

a campear não sei o que.

Pois busco na insensatez

motivos pra caminhada

pateando os cascos já gastos

na solidão das estradas.

 

Por entre asfalto e cimento

me deparo com a figura

de um velho maltrapilho

deitado defronte a porta

de uma loja qualquer.

Recebendo as vibrantes carícias

de um vermelho néon

que lembravam vagamente

matizes de um por de sol

no entardecer da querência.

 

No vai e vem das pessoas

que ali passavam depressa

no anseio de seus rumos.

Fez parada num repente

a esguia silhueta de uma linda mulher

Aproximou-se do velho

e com um gesto singelo

lhe convidou pra segui-la.

 

Foi então que essa mulher

numa prosa espichada

- dessas que se comunga

nas horas crepuscular

numa roda de galpão -

Indagou-lhe dos seus medos,

apontando para os rumos de um albergue.

 

Nessas idas rotineiras

que a moça por lá fazia

para ofertar-lhes ajuda,

encontrou por muitas vezes

aquele velho maltrapilho

que por ali se aquerenciou.

 

Um dia de volta às casas

foi chamada pra uma "séca"

por aquela velha figura.

Tinha na sua estampa

as voltas de "uns sessenta"

as faces amorenadas

pelo sol forte da lide,

as mãos, o condenava

pois trazia os dedos tortos

moldadas por cordas brutas

em tironaços de anos.

 

Chega a noite meio tímida

e a boieira, meio de contra gosto.

por entre torres de aço

vem saldar aquela prosa que,

entre risos, chistes e choros

fez morada em pensamento

Sim porque ali já se achegaram

outros da mesma "tropa",

para a charla costumeira.

 

Então numa vã fronteira

entre o urbano e o rural

com ela o martírio de volta

No povo, fecham-se as portas

nas suas fábricas loucas.

E o campo abre as porteiras

perdendo homens de ofício.

Ah! meu Deus, como voltar!

 

E a noite segue ao tranquito

ouvindo antigas bravatas

em volta daqueles homens,

que junto a um velho latão

usaram suas próprias camas

pra reviver novamente

o nosso fogo de chão.

 

Quando o sol reponta lumes

trazendo o dia de volta

para mais um cotidiano,

Retrata naquela praça,

alguns homens maltrapilhos,

restos de um fogo grande,

algumas garrafas vazias

e baganas pelo chão.

Pedaços de sonhos lindos

que os tironaços da vida

rebentaram nos corredores.

De tantos golpes de esporas

e de muitos desamores...