RETALHOS DE ALMA
Maicon Cigolini
Longe...
Tempos,
Outros tempos...
Recuerdos
Lembranças.
Mas perto,
A tropa,
Soldados,
Armas empunhadas
Carregadas contra o
horizonte.
Bandeiras altas
Levantadas,
Cortavam o grande azul do
céu.
Cavalos marchando,
Seguindo...
Uns olhares distantes
Procurando alguma coisa.
Uns olhares acanhados
Com medo de enxergar algo.
Dois ou três cuscos
Acompanhando a tropa.
Que seguia...
De quando em quando
Um pedaço de charque,
Que entrava quase que
Rasgando o vazio do estômago.
Na cintura de cada um
Uma faca bem afiada.
Na cabeça,
O chapéu que protegia
Do sol forte,
Que quase rachava.
Para uns,
Era a primeira vez...
Mas para outros,
Que já tinham perdido a conta
De quantas batalhas e quantas
guerras
Já haviam participado.
Que tinham no peito
Inúmeras medalhas,
Apenas uma quase certeza,
De que esta não seria
Como as outras.
Mais uma olhada no horizonte,
Distante.
Além do que a vista alcança
E nem sinal.
Três dias marchando,
Nenhuma bala disparada.
Estava pacato demais!
O calor era intenso,
sufocante.
O lenço vermelho
Encharcado de suor.
O trote de cada pingo
Formava ecoa
Próximo ao mato.
As árvores antigas
Enormes,
Pareciam sentenciar
O que iria acontecer...
Os cavalos iam invadindo
A mata como se
Entrassem em corações.
Um gaúcho observa
A bandeira...
Linda...
Tremulando...
Mas de repente,
Uma bala vem
E atravessa a bandeira.
Todos os farrapos
Olham pros lados procurando
Alguém.
O silêncio invade o mato
E a apreensão também!
O silêncio é interrompido
Por uma bala
Que acerta o peito do
capitão.
Só que depois dela,
Vem outra,
outra e mais outras...
Os pobres maragatos
Atiravam para todos os lados.
Barulho era,
quase só de bala.
Mas os chimangos eram muitos!
E os tiros vinham de toda
parte...
Os maragatos iam caindo
Formando poças de sangue.
Muitos pingos foram acertados
E tombavam.
Algumas pilhas de gente
Pelo chão,
Enquanto os tiros não
cessavam!
Emboscada...
Em pouco tempo
Os maragatos estavam no chão.
Dentre tantos chimangos,
Poucos caídos.
Mas de lenço vermelho
Um taura ainda havia,
Tinha aparência jovem.
A arma estava em punho,
pronto pra continuar esta batalha.
Ele
E todos os outros.
Enfrentou com coragem
E não se rendeu!
Um chimango apertou o gatilho.
A bala veio
E acertou em cheio
O coração daquele peão.
Foi tão rápido que ela entrou
E matou o maragato!
Todos os outros
Acompanharam em silêncio
A queda do farrapo.
Depois disso,
Pegaram umas coisas e uns
pingos,
Viraram as costas
E tomaram seu rumo.
De todos aqueles mortos,
Alguns retalhos de alma...
Sem vida, sem nada.
Assassinos covardes!
Destruíram a bandeira!
Ninguém teve piedade
Daquele gaúcho.
Morreu calado.
Aqueles homens escondidos
Armaram uma emboscada.
Roubando vidas.
Estraçalhando almas!
Que a lembrança que se tem
Não se pode ver.
São resultados de guerra:
Corações que não batem
mais...
Restos de gente,
Retalhos de alma!