VELHO TAITA

Luiz Menezes

(Em memória de meu pai)

 

Velho Taita de outras eras

Te vendo sob a ramada

Com a melena desgrenhada

Bombeando não sei pra onde,

Sinto que teu peito esconde

Sem mágoa ou ressentimento

O arroio esquecimento

Que sempre bandeaste a nado

Nesse pilungo judiado

Que chamas de sentimento.

Rememoras o Passado

Cheio de grito e arruaça

No temperar de uma raça

Forjada no entreveiro...

Velho Taita trapaceiro

Nas carpeteadas de amor!

O teu violão era flor

Num truco de serenata...

Há sempre luar de prata

Na alma de um payador.

 

Quanta china te maltrata

Nessa lembrança cansada

E ao ouvir a clarinada

Do inverno que te abraça,

Assim no más, por chalaça

Sobre o violão te debruças

E uma saudade soluças

Numa terna cantilena...

É linda a mágoa serena

Que no peito escaramuça.

 

Passa a mão pela melena

Meu velho Taita aragano,

Bombeia que o desengano

Te fez apenas sonhar...

E é tão lindo recordar

As penas já sepultadas

Que como almas penadas

Vagueiam sem fazer mal...

Lembranças de temporal

São árvores derrubadas!

 

De um crioulo bagual

Teu coração tem o tranco,

Por ideal o lenço branco

Nunca deixou teu pescoço;

Carregas almas de moço

Nos teus setenta clavados

Sem alusão aos pecados

Que devem andar por ai...

Pois sempre falam de ti

Os ranchos mal assombrados.

 

Pões na razão um bucal

Levaste uma vida e tanto

E ao evocar o teu canto

Tão cheio de picardia,

Eu sinto por ironia

Velho Taita mulherengo

Que como tu nasci rengo

Com a mesma balda no lombo

E não há de ser de um tombo

Que morreremos um dia!