VAQUEANO
Luiz Menezes
Sou um vaqueano sem rumo
Pra quem a estrada não
conta...
De tanto cruzar atalhos
No lombo dos horizontes,
De tanto cruzar os montes
Canhadas e coxilhões,
Fui descobrindo as aguadas
Das invernadas perdidas
E também o cruzador
Das sangas fundas - no
inverno -
Lugar que a gente bandeia
Na esperança de que a sorte
More no lado de lá...
Fui conhecendo os caminhos
Pra viajar noite sem lua...
Aprendi entre outras coisas
Que quando se avista ao longe
As cinzas de um fogo morto,
Sempre tem aguada perto
Justificando a pousada.
Mas com toda essa experiência
Chego ao final da existência
Bem mais descrente e mais só.
Sou um vaqueano sem rumo
Pra quem a estrada não conta.
No campo do amor, caramba!
Fui um vaqueano solito.
Como a astúcia é do meu tombo
E a malícia me fascina,
Sempre um sorriso de china
Me
encontrou morando perto.
Chegava assim despacito
Como quem entra em arroio
Com medo do pedregal...
Porque sempre acreditei
Que no silêncio do homem
De fala mansa e pausada,
Há um ar negro de mistério
Que faz a china cismar...
O catre é uma conseqüência
Na doma do bem-querer...
Depois madrugada, aurora
Alguém que se vai embora
Até a volta! E nunca mais.
Sou um vaqueano sem rumo
Pra quem a estrada não
conta...
Lendo a tabuada da vida
Que sempre dá resultado
Pra quem soma mais defeitos,
Aprendi que o homem vale
Pelo que diz de si mesmo,
E quando paga a despesa
Até aplaudido é...
Vez por outra, num bolicho
Me
reencontro no balcão
E fico ouvindo os borrachos;
Quase sempre são sinceros
No que dizem sem pensar...
Na irreverência da canha
Quem toma um trago, garanto,
Se engarupa na verdade...
E fico bombeando a porta
À espera que de repente
Surja lá um guasca sem nome,
Desses que são caborteiros
Com uma guitarra na mão.
Aí eu encontro irmão
Rengueando da mesma pata.
Só existe espontaneidade
Naquilo que brota d’alma...
Sou um vaqueano sem rumo
Pra quem a estrada não
conta...
Hoje quando ao pé do fogo
Tomo um mate solitário,
Vou desfiando num rosário
Todas coisas que aprendi.
Nesta evocação serena
Sinto o meu violão vibrando
Tendo um canto diferente:
É o canto cor de saudade
Que juntei pelos atalhos
Por onde um dia cruzei,
Com corpeadas
e negaças
Que usei nas minhas trapaças
Com as mulheres que amei.
Mas com toda essa experiência
Chego ao final da existência
Bem mais descrente e mais só.
Vaqueano em tantos caminhos
Proscrito em tantos amores,
Só uma vez me perdi:
Sabe Deus onde andará...
Talvez tenha me esquecido,
Eu dela nunca esqueci.