Luiz Menezes
Chegou, sem pedir licença
Me viu sentado, sentou.
Eu esperei que falasse
Ela falar, não falou.
Após um longo silêncio
Pediu que eu pagasse um trago.
Pedi dois, um para mim.
Esvaziou o copo num gole
Talvez em busca do efeito...
Paguei-lhe outro, mais outro
Afinal pensei: A pobre!
Quer se afogar que se afogue
Cada um sabe o porque...
E sem diálogo ficamos
Ali sentados, calados
Nada havia pra dizer.
Nossa ligação estava
Naquele brinde de copos
Da mesa de um bar qualquer,
Onde uma estranha mulher
Chegou, sem pedir licença
Me viu sentado, sentou.
Seus olhos semicerrados
Vagavam em devaneios
Talvez famintos de afetos,
Na meia luz desse bar...
Bonita, muito bonita,
Judiada porém bonita.
Era a beleza agressiva
De quem está de mal com o mundo
E para o qual derramara
Seu mais amargo rancor...
Entre murmúrios e risos
Se ouvia a voz de um cantor.
Era a imagem da ironia:
Fingindo um canto alegria
Chorava pra um falso amor...
E a platéia indiferente
Escutando sem ouvir,
Ia no impulso do trago
Aplaudindo sem sentir.
Foi quando a moça sorriu.
E diante do meu espanto
Me disse: “Sabes? Eu canto,
E muito, muito cantei...”
Pensei: será que a conheço?
Ela sentiu a surpresa
Que por certo demonstrei.
Voltou para seu silêncio.
Esperei que continuasse
Mas nada mais comentou...
Depois de um instante breve
Abriu uma bolsa surrada,
Tirou um velho retrato
Com emoção me entregou...
Eu quase morri de espanto,
Na foto do desencanto
Estávamos de mãos dadas,
Os dois, olhando pra o nada
Num instante inconseqüente
Que nem o tempo guardou...
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...E se foi como chegou
sem dizer uma palavra
nem ao menos um adeus...
Fiquei calado, pensando
Olhando os copos, lembrando,
Oh! Meu Deus como sofri.
Tempo amargo eu te maldigo!
dizer que fui seu amigo
E nem a reconheci...