A MORTE DE PEDRO NINGUÉM
Luiz Menezes
Veio a cantiga da noite
na garupa do aguaceiro
cabresteada pelo
vento.
Até um relâmpado
alçado
andou pateando o espaço
preludiando um
temporal...
Mas oigatê
como é brabo
este tal de mês de agosto!
A voz do preto Clarindo
veio do fundo do rancho
que se velava o finado:
O Juca, vai
lá na venda
e compra dois real de gayeta
e um naco de fumo grande
que a noite vai ser comprida...
Lá fora o céu era negro
assim como um campo grande
que fora queimado a pouco
O Juca pediu a benção
prá seu padrinho
Clarindo
e se enfurnou noite a dentro
na direção do bolicho.
Agora só a luz das velas
clareava os rostos sombrios
da peonada no velório
onde o respeito era pouco...
Pois entre risos e ditos
iam se contando causos
de peleias, de carreiras
e de chinas mal-domadas
esquecidas do finado.
Foi quando o preto Clarindo
compreendendo o desrespeito
pelo coitado do morto,
tirou uma longa tragada,
pigarreou como pensando
para afinal sentenciar:
O homem que nasce pobre
é como um cavalo xucro...
É pealado
pela vida
sofre a doma das tristezas
até que um dia se amansa
perde a vontade e a fé...
Depois já sem serventia
morre na beira do alambrado
esquecido...sem ninguém!
Vejam vocês nesta noite,
o Pedro já não existe.
Amanhã se vai o corpo
pois a alma do coitado
de há muito já estava morta...
Andava assim como andam
miles de guasca sem
rumo,
fugindo pelos atalhos
do povoado e das taperas.
Bueno total é a vida!
E amanhã será um de nós...
Até a viúva quando saiba
que o pobre Pedro morreu
decerto vai chorar pouco.
Chorar é prá
quem tem tempo
e o tempo prá o pobre é
escasso
prá se lastimar atoa,
quando já não se tem
remédio
nem a esperança num cobre.
Livino,
me passa a canha
que é prá esquentá
o pensamento!
Caramba como faz frio
neste tal de mês de agosto!
Um trovão rolou no espaço.
E a chuva seguiu cantando
no funeral da saudade...
Saudade? há,
há,
Ora, saudade!
A saudade não tem tempo
de chorar Pedro ninguém!!