Restolhos
Luis Lopes de Souza
O sol emborcou o lume
na anca do horizonte,
como apagando os braseiros
dos fogões do universo...
A noite velha imponente
num matiz mirabolante,
derruba um chapéu de sombras
na carranca de gigante...
A mão morena das trevas
vai debulhando as estrelas
e, estraviando punhados
nesse panuelo estendido
na amplidão das alturas,
sobre meus olhos parados
num turismo de amargura...
... O gado rumina o pouso
na orla do arroio...
Um responso tresloucado
se faz ritual olvidado
nas cantigas de aboio...
O perfil da lua cheia
reflete a imersa magia
na margem erma do açude...
a indagar os silêncios
que vacilante hoje sigo,
parece que acabrunhada
parou pra cismar comigo...
Os pirilampos, pitando luzes
fugazes
campeiam rumos e acasos,
como reasteando os candeeiros
de pálidas labaredas
que, saradeam acanhadas
em contra dança com o vento,
desenhando sombras guenzas
de campeiros refugiados
em recuerdos sonolentos...
A batida de um monjolo
marca a cadência da noite...
Onde, há um pilão desocupado
socando um bojo vazio
e um murmúrio de água mansa
com clareza de cristal
que o cobiçoso não viu,
pra se perder no remanço
das águas grandes do rio...
... Com lamúrias e soluços
canta triste o urutado...
... A coruja alça vôo
ofertando mau agouro
à vã crendice que trago...
Misto de medo e encanto
no misticismo do pago...
Uma imagem taciturna
se faz funda na cacimba...
Onde há um espelho rodeado
de avencas e madressilvas,
com quietudes que combinam
ao dedilhado tranqüilo,
na pauta de uma só nota
da guitarra de algum grilo...
A lua, descamba lerda
no coxilhão do infinito,
por onde surge a boieira
com rubro cismarento
de sua ronda madrugueira...
... Meus olhos cor de aurora
são peregrinos de ausências
na madrugada serena...
Que chegou branda e silente
pra orvalhar a melena,
e afugentar as insônias
com gotas mornas de pena...
Sim noite amiga!!!
Tudo isso já foi meu...!!!
- Cada palmo dessa estância
é um restolho de mim mesmo...
Hoje..., nesta minha alma terrunha
só há um vazio de tapera
com escombros miseráveis
numa atávica quimera...
... Agora..., só silêncio...!
Há uma nesga de arrebol
preludiando um novo
dia,
mas, antes da réstia de sol
estarei além da porteira
na mesma estrada que vim...
neste pago hoje alheio
sepultarei restos de anseios
pra ser fantasmas, de mim...!