RESPONSO PARA MEU PAI... “Resumo verídico

Luis Lopes de Souza

Do luzeiro incandescente
sobeja só uma réstia...

 

Esse corpo diminuto
já foi cerno humanizado
com imponência no porte...
Mas hoje mal verga o catre
num silente fenecer...
Resta uma alma sem pressa
com aura de santidade,
que abana asas de adeus
no rumo da eternidade...

 

Foi gurizito de campo...
Foi mocito marca touro...
Proliferou sua casta
com vasta polivalência,
fez tudo o que a vida cobra
de um terrunho da querência...

 

Demarcou sucias e sonhos
nos aceiros das queimadas...
Abriu clareiras de anseios
em trincheiras de coivaras...
Semeou eitos de suor
nas razões das empreitadas...
... viu farturas iludidas
germinando em cada grão,
em searas limitadas
em meio palmo de chão...

 

Perfilou taipas de pedras
em piquetes e quintais...
domou, carretiou, tropeou,
castrou touros e baguais,
socou léguas de palanques
com capricho redobrado
sem lamentar não ser dono
de nem um vão do alambrado...

 

Salgou a voz malograda
no silêncio das amargas...
das colheitas muitas vezes
restaram ralos restolhos
sem valia na balança...
das tropeadas muitas vezes
restaram magros borregos
refugos de alguma estância,
mas que surtiam a mesa
e engordavam a esperança...

 

Hoje, quando o mal irreversível
se faz algoz insensível
desse velhito tão boeno,
é que indago os mistérios
da transcendência terrena...
- A morte tem hora certa?
- A alma só desencarna
quando Deus da o sinal?
- A morte é uma reticência
ou é um ponto final...??

 

Eu bem sei “Patrão Divino
que, “é feita a vossa vontade
assim na terra como no céu...”
Mas, a contristada aparência
e essa constante dolência
desprovida de lamentos,
me dão forças embora dúbias,
pra pedir pelo descanso
do meu velho, quase um santo...

 

Ficará eternizado
pelo que foi e o que fez...
Pela calma inconfundível
até pra um severo pito...
Pela sábia austeridade
ao definir o correto...
Por demonstrar em seus atos
que pra ter honra e caráter
não é preciso ter cobre,
são virtudes necessárias
nas evidencias de um pobre...

 

Guardarei cada detalhe,
de suas mãos calejadas mas de afetos...
de seus braços cansados mas de abraços...
de seu olhar vago mas com pureza
e de seu sorriso escasso mas sem magoas.
... a vida foi sem fortuna mas sem tristeza...

 

Verdade...
Do luzeiro incandescente
sobeja só uma réstia...

 

Sim... “Onipotente...
Por piedade ao meu velhito
suplico seu perecer
pois, se a morte e uma reticência
há uma sagrada seqüência
de morrer... pra renascer...