Monólogo de um Rancho Apenas
Luis Lopes de Souza
Restou a imagem tosca
Ruindo vã e fugaz,
A quem fareja em concreto
O cheiro escasso da paz ...
... já
no ranjido da porta
o gato morisco foge
pelo vau da cumieira ...
junto ao pilão canjiqueiro
a peneira e a gamela,
que carijó ceresteiro
tenteia em pé na janela ...
- Na outra sala, a cozinha ...
O chão batido com cinza
Das brasas do tarumã,
O santa-fé da quincha
E os caibro de guajuvira,
A fumaça decorou
Com rendas de picumã,
Dando ao esboço do olhar
A impressão resumida
De uma noite sem luar ...
... a
manta de charque fresco
enxuga sobre o fogão,
e um macaquinho de erva
secando de prevenção ...
... um
cepo para acento
forrado com um peleguinho.
... em
riba da mesa larga
uma abundante fartura
de iguarias benditas
ao labor de mão amáveis
calejadas mas, bonitas ...
... na
parede um arsenal
de tarecos da campanha
um par de esporas, um chapéu,
uma tesoura pra tosa,
uma guaiaca sem plata,
estribo, marca, sovéu ...
Uma mala de garupa
carregada de atavismo
e, um violão milongueiro
misto de acorde e mutismo ...
- Na outra sala, a
de estar ...
O cheiro da maçanilha,
Arruda, manjericão.
Pela porta escancarada
O grito da saracura,
Da caburé, do tajã ...
Desmentindo a quietude
No legendário retrato
Dos patriarcas do clã ...
Um lampião a querosene
Iluminava flaquito
Aquele escuro matiz,
Na mais humilde riqueza
De um mundo só, mas feliz ...
Resta o quarto de dormir ...
Moroso, fusco e silente ...
Guarda o mistério estranho
Do amor entre os avós,
E por isso
..., tão somente por isso
Nós respeitamos
...!
Quem dera que o mundo
Fosse feito de ranchos
Iguaizinhos a esse !
Simples, cordato e nobre ...
Uma igualdade terrunha
Sem ter rico e sem ter pobre ...
Restou a imagem tosca
Ruindo vã e fugaz,
A quem fareja em concreto
O cheiro escasso da paz ...
Rancho, que igual já não existe ...
Rancho, que igual já não se faz ...
Rancho, que se apaga no olhar
triste
Ao eco de um lamento ..., nunca mais ...!