Provincianas
(Tributo às Mulheres da Pampa)
Luciano
Salerno
No horizonte... O dia floresce criança,
A magia da luz a cada novo tempo
Traz em seu fulgor íntimas lembranças.
Na Bandeira... O tempo redivivo na memória,
A procedência das matas, do ouro e do sangue
Que as batalhas timbraram a nossa história.
O dia desperta com o relógio do tempo
Em verde-mar nas canhadas,
Meus olhos cruzam rumos e passado
Num voo silencioso pela estrada.
Volto no tempo pelas fronteiras da pampa,
Quando tratados e cartas de sesmarias
Traduziram a história da minha estampa!
Trago nas veias, o gen protetor do ser,
A miscigenação de raças desta terra.
Vim do “clã” de altivas mulheres,
Que forjaram os centauros a barro e pedra.
Quando o som vibrante de clarins em marcha
E tambores surdos retumbaram pelo chão,
Um antigo alforje impregnado de ventos
Repontou caudilhos para na lutar na revolução.
E assim dotada do espírito provinciano
Pela defesa da terra, a mulher gaúcha
“...esqueceu
delicadezas, ternuras de quase-noiva
E atou os
cabelos negros debaixo de um chapelão
E se
atirou no trabalho, cuidando da casa
E campo,
do gado e da plantação”.¹
Na voz... Trago o timbre clamando por liberdade,
O grito charrua que exalta o canto terrunho
Que de outros tempos escravizaram a verdade!
Nos olhos... Tenho o matiz da gesta guerreira,
Que guardou ranchos, rezou pelos ausentes
E se fez senhora nas lidas campeiras.
Sou neste tempo resumo dessas mulheres,
A chama crioula pras rondas fogoneiras,
A palavra que conforta corpo e alma,
O fulgor ancestral da estrela boieira!
A água modela a terra por onde vai cruzar,
E no seu longo caminho que roda-redondo...
Tal como um moinho em aceno e cantar,
Vai pelos rumos de nossa querência
Imitando a formosa escrita da pena...
Que derrama antigos sonhos e destinos,
Deixando a alma retovada em poemas.
Teu tempo é quando?
Meu tempo é quando?
Ver os ancestrais na estrada antes dos passos
Cintila nas retinas uma vertente de pranto.
Imagens e estórias na moldura de prata
Das mulheres que tem na beira das retinas
Tempo e silencio vivos num retrato antigo...
Dessas - Senhoras de Si – que fizeram o tempo parar
“... Que
estão ali em preto e branco...
... O
mesmo mistério no olhar!”²
No campo... O poente em luz e cor,
Se debruça nos escaninhos da memória,
No coração da paisagem, na estação em flor.
Pela estrada de manso chega à sombra do dia,
A província romanceia o tempo e o vento,
Enamorada vislumbro sua geografia!
Vem deitar-se pelo poncho da noite
Essas estrelas guerreiras das horas xiruas,
Assim, pela madrugada posteira
Exalto a história em cada quarto de lua.
Ficaram nas estâncias as mulheres em retrato...
Na espera da alma farroupilha do seu general.
...Decerto delas herdamos
essa força primitiva,
Essa fé que nos anima,
Que mantém a raça viva,
perene através da idade.
Da mulher quase cativa nasceu
esta gente altiva
Que ama tanto a liberdade!³
Volto do passado trazendo no meu íntimo ser
A -Estrada Real-, o lume do -Fogo Eterno-,
E a -Estrela D´alva- luzindo ao amanhecer.
Os de amanhã, ansiosos de passado e futuro
Hão de me encontrar no obelisco
Vigiando a província num tratado de paz!
Timbrada no tempo sou as mulheres da pampa
A razão da história que vem no cruzeiro do sul.
Altiva, tremulante, lá esta a nossa bandeira
Neste tributo as guerreiras do Rio Grande do Sul!
1 – Fragmento
do poema:
Mulher
gaúcha de Antonio Augusto Fagundes
2- Fragmento
do poema:
Senhoras
de si de Julio Cezar Paim
3- Fragmento
do poema: Retrato (romance das mulheres dos guerreiros) de Delci
Oliveira
Composição
poética inspirada em obras que retratam a força da mulher na formação
rio-grandense.