AOS SENHORES DOS RETRATOS
Luciano Salerno e Matias Moura
Como um fim de tarde diante do
firmamento...
Parece que se foram os dias de sol naquela estância.
O mate não cantou o ronco em
voz de acalanto,
O tempo sacando o poncho e velando
seu pranto
Que até os pássaros
entenderam esse canto.
Parece
que o silêncio se achegou ao tranco manso...
Pelas
fendas da estrada da alma dos que se extraviaram
Pelas
horas inquietas de um tempo que se vai pelo pago.
Não
mais...
...os
relinchos dos potrilhos retoçando junto à ramada,
...os
berros dos tambeiros que roçavam o pescoço no arame,
...os
rangidos da carreta cortando pampa e coxilhas,
...o
canto da cigarra que permuta sinfonia errante!
Por que se calou a guitarra
num canto do galpão?
Por que se calaram as esporas
no sul das botas?
Esses solitários avios retratam
a estância
Olvidada pelos donos que
pegaram
O rumo povoeiro por precisão
ou ganância!
Como
era grande aquela velha estância esquecida,
Nela
havia muitos peões, agregados e capatazes!
Cada
qual com sua função, alguns cuidavam do gado
Sempre
bem montados em fletes buenos!
Outros
cuidavam das lavouras que se desenhavam
Na
geografia da estância: trigo, arroz, milho e feijão.
Como
era linda a cor de ouro nos campos!
A
colheita sempre enchia de esperança o galpão.
Quando
o dia se ia, pela madrugada vozes surgiam
De
gaitas e guitarras nas rondas e quarteadas,
As
moças vinham e balançavam seus vestidos
Ao
redor do fogo grande romanceando com a peonada!
Esquecidas ficaram as casas
naqueles nacos de campo,
Onde, na parede grossa de
pura pedra empilhada...
Um relógio antigo marcava o
compasso das horas
Assinalando o vai e vem das
primaveras passadas.
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Hoje,
Me quedo solito admirando este
retrato
Que habitava as paredes de
pedra bruta empilhada
De uma antiga estância num mosaico
amarelado.
Fico
a pensar olhando tudo na volta,
Parece
que o tempo romanceia saudades...
Quando
admiro o passado da nossa gente...
Nesses
retratos dos senhores de antigamente
Que lidavam com baguais xucros pelos setembros
gastando
seus dias empurrando tropas tempo adentro.
Agora repousados e inertes em
profundo silêncio
Suas bocas cegas, seus
olhares mudos...
Parecem admirar a mesma vida que
era sua outrora,
Sem poder recitar versos ou cantar
milongas,
Sem poder contar seus causos
no galpão grande!
Que triste fim para esses corações que antes
Batiam em compassos na pampa imensa.
Prendo o olhar nessas janelas abertas para o passado
E
a inspiração brota como cacimba neste poema,
Pois a vida é “mui”
linda e temos que vivê-la plena!
Porque... quando o sol nos faltar,
seremos apenas antigos retratos amarelados...
...em alguma estante a repousar.