ROMANCE DO GUASQUEIRO SÓ

Loresoni Barbosa

 


      Agosto alçou o poncho

      sobre os ombros da coxilha,

      entranhando nas canhadas

      todo sabor da invernia.

      A noite chora nos campos

      serenas lagrimas frias,

      não se vêem pirilampos

      luzindo pelas campinas.

 

      Reflete n'água do açude

      uma tropilha de estrelas,

      repontada pela lua

      entre nuvens passageiras,

      a boeira mostra o rumo

      pro coração estradeiro,

      que retumba cá por dentro

      estropiado, sem parceiro.

 

      Um temporal de saudades

      encharca as noites de espera,

      ausência bate na porta

      deixando o peito tapera.

      No remanso há um par de sonhos

      boiando no mate frio,

      são retalhos dos meus olhos,

      que mergulharam no rio.

 

      As raízes do espinilho

      vão abraçando as cambonas,

      o fogo queima horas largas

      sigo entoando milongas.

      O minuano assoviando

      vem descendo as canhadas,

      repontando quero-queros

      na solidão das estradas.

 

      Procuro versos costeiros

      pelos ga1pões da memória,

      sovando corda e recuerdos

      ao lento passar das horas.

      E quando a saudade apeia

      nos pensamentos guasqueiros

      tranço lamento e poesia

      guitarreando pros luzeiros.

 

      Quem sabe os ventos teatinos

      que vagueiam campo a fora,

      tragam teus 1ábios sorrindo

      pra matizar minhas auroras.

      Pois quem encanta as estrelas

      com versos e partituras

      de encontrar uma delas

      perdida nessas planuras.

 

      Minhas retinas se alargam

      mirando ao largo a boeira

      e o rneu cantar procurante

      ressoa ao 1éu sem parceira,

      então sofreno essa ânsia

      de andar degustando as noites

      e volto a beber nos mates

      saudades de a1guém distante.

 

      O vazio das madrugadas

      preenche o rancho de anseios,

      e até os pelegos do catre

      sentem falta do teu cheiro.

      Restou nas várzeas do tempo

      restevas do amor ausente,

      e em meu coração charqueado

      raízes do amor presente.

 

      Sigo acordando sóis

      que pingam réstias no poncho,

      e as janelas bocejando

      pintam quadros no meu rancho.

      Quando a guitarra emudece

      e o meu peito se encerra,

      a juriti ensaia um canto.

      Que saudades da primavera!

 

      Quem sabe esse tempo amargo

      sinta sede dos verões,

      bordando pastos nos campos

      pra saciar recordações.

      Quem sabe ao passar o inverno

      possas voltar a querência

      e sentir o aroma das fibres

      que choram a tua ausência.