NA
PENUMBRA DOS LUZEIROS
Loresoni Barbosa
Lá, na beirada do rio grande
onde a brancura das dunas
degrada o verdor dos campos
e a imensidão azulada,
um tal José Clarimundo
divide imenso candeeiro
com seus parceiros de penas
que também são sentinelas.
Este responso que herdou
de entardecer bem na copa
de um mangrulho de cimento,
às vezes, lhe causa angústia
por não poder ver de perto
a embarcação que se vai,
levando sonhos pro cais
deixando coplas ao vento.
É qual o João Barreiro tristonho
parado à porta do rancho
que espera com triste canto
a fêmea que ainda não veio.
Embora cansado seja,
curtido pela aspereza
das intempéries do sul,
inda se encanta co’a luz
que é a única testemunha
de sua eterna bondade.
Pois sempre - todas as tardes –
empurra sua sombra esguia
junto co'a sombra do mundo
rumo ao farol que lhe espera,
para alumbrar mar e terra,
para orientar
caravelas,
clarear o breu num segundo.
Depois, de volta no rancho
entre o acende e apaga
do castiçal beirador,
Clarimundo – bom guasqueiro –
trança a finura dos tentos
com a perícia dos ventos
que fez morada em seus dedos.
Mas logo, a saudade atraca
no cais do seu coração,
pois na fumaça de um tição
que chora a dor das feridas –
passam qual nuvens no céu
lembranças de um temporal
que o fez tristonho pra vida.
Escureceu o horizonte
nos lados do litoral
e enfurecido o mar veio
como mil tropas em cargas
com seus lançaços de mágoas
sugando vidas pra si.
Lavando a orla do mundo,
deixando um vazio profundo
nos olhos que eu conheci.
Nesta terna parceria
de coureador e guasqueiro,
os couros mortos nas carnes
renascem - lindos aperos –
ponteados com mil carícias
pelas mãos do Clarimundo
que nem faz conta dos calos,
pois, quem mereceu afagos
e navegou em seus olhos
para embalar sua paixão,
levou para além mar
o brilho do seu olhar
e um naco do coração.
Lá, na beirada do rio grande
um vivente afoga as mágoas
gastando coplas pras águas
vencendo o breu num segundo.
Depois, no rancho de palha,
trança lembranças da amada
entre o acende e apaga
de um candeeiro moribundo.
Pobre luz que não afaga,
tão triste pra um Clarimundo.
Quem sabe a noite por buena
tendo a lua por lampião,
poupe as estrelas do céu
e acenda as outras do mar,
só pra clarear Clarimundo
quando o farol, que é seu mundo
deixar de ser e apagar.