A SECA
Lauro Antonio Corrêa Simões
É
verão...
A
seca diaba se parou puava!
China
perjura que nos deixa mágoas!...
Até
a roldana do poço que cantava
no
vai e vem da corrente, foi mermando!...
Quando
o balde vai, leva um cabresto;
Quando
o balde vem, é um pingo d’água!
“Ai”
que madrugar-se para um mate, antes do dia,
nessa
Esparta pastoril de rodeios e silêncios!
As
prosas falam da seca, de tristezas e penúrias!
Os
rádios contam do tempo, tão sem tempo pr’á quem lida...
É a
vida no mas, correndo, escaramuçando em fúria
e
nos galpões das estâncias, as almas comovidas!
Então,
é o campo...
o
olhar do peão campeiro - ao trote valeiro do seu pingo
baila
pelos repechos e os capões-de-mato
nessa
faina gaúcha de amansar distâncias e varar coxilhas.
O
chapelão desenhado na sombra cirandeira o seu sutil retrato.
Homem
e animal sonhando com um ocaso promissor!...
No
céu, o sol repontando lumes com punhais delgados,
a
tisnar pelagens de matiz tordilhas
parece
- lá em riba - a almanjarra de um embolsador
a
engolir - os velos dessas nuvenzitas de sina andarilha.
Na
seca
a
solidão dos campos em paz habita a alma
e,
as desesperanças dos homens cobram o preço!...
O
flete, o facão, as esporas e o laço forte
são
os fiéis parceiros de lides e jornadas...
Até
o cusco, velho companheiro, vira estorvo!
Dói
o coração à anunciação da morte,
ver-se
a rês sedenta, trôpega e cansada
em
derradeira carga, atropelando um corvo.
As
Coqueiros,
xerenguitas
de alisar as palhas
e
picar um naco para um bom crioulo, pularam mil vezes das baias cruas
num
serviço bruto que não dá consolo!
Sangrar,
courear, perder-se a ilusão
um
bicho que olha nos olhos da gente
num
soluço passional de dor e perdão!
Da
seca,
se
alguém quisesse pinta-la n’álgum quadro,
por
certo, seriam tão somente duas cores!
O
baio-alobunado das várzeas já silentes
e,
o rubro, quase sangue das barras do poente!...
Um
outro, talvez acrescentasse à tela-natureza
o
pardo modorrento da sombra de um umbu,
solitário
e guapo de ancestral chucreza!
A
seca no verão sempre é um tormento!
Limpar,
aguadas, antes buenas nos verões chuvosos,
hoje
lamacentas pela força da estiagem
e,
de a cavalo, o facãozito robonado,
mutilar
aroeiras de melhor ramagem,
pra
mitigar a fome que castiga o gado.
As
divisas d’água, o sol devora!...
Os
arroios secos entre lindeiros
ostentam
os ramais de “cruza” inútil
suspensas
ao vazio por rédeas brutas,
no
leito que agora serve de caminho.
Os
bichos vão e vem, que importa a marca
a
tarca já não conta as recolutas
desse
Mercosul campeiro entre vizinhos!
Ah,
as soalheiras, bagualas campeiras,
bafejando
às fontes a carícia morna
sobre
as fundas vergas de suor e pó...
D’onde
“ai” água, o limo estendeu a colcha!
Na
vertente rosa, o gado debruçou barrancas
e,
nas nuvens brancas repousam os olhos
do
peão sem tempo falquejado a enxó!
Contrabandeiam
saudades essas nuvens
que
vem e vão, lerdarronas no infinito,
sem
uma gota d’água no seu ventre!
Entangue
as lágrimas torturadas dos aflitos!
É
uma saudade de chuva que machuca!...
A
noite, são as lanças paraguaias dos mosquitos;
De
dia, os batalhões bladengues das mutucas”
Porém,
a seca, assim como chegou, emala o poncho
e -
qual um touro alçado ao pressentir o desatar dos laços -
se enfurna
nas lonjuras com sua tropa de martírios!
Chega
a paz nos cafundós, pranteiam nuvens
a
dádiva do céu, florindo lírios
e a
voz das sangas renasce nos potreiros!...
As
prosas, então esquecem das tristezas,
pois
o Pintor Supremo repinta a natureza
tingindo
a terra e os sonhos do rude peão campeiro!