ALMA DE POTRO
Lauro Antônio Corrêa Simões
Oigalê
campo velho!
Segue
em meus olhos, tempo afora e alma a dentro,
sacando
tentes pr’á emendar - mesmo a
cavalo -
o
laço forte que maneou meus
sentimentos!...
Amor
a terra!...
Dito
da alma que tem a doçura do mel de mirim
e
que os meus olhos de homem campeiro
sempre
encontraram nos peraus de mim!
O
amor ao pago, se “ajustou” na lida
e,
sem querer, um dia, de luzeiro
foi
alumbrando meus rumos parelheiros,
norteando
os passos que trilhei na vida!
Sim,
terra baguala!
Pra
que te sabe, és sesmaria de ternura
por
me deixares no sem fim desses repontes,
semear
meu rastro e engolir essas lonjuras,
numa
insaciável sede de horizontes!
Mas,
quando os minutos da vida já são “talha”
para
um guapo domador que envelheceu;
Se
os olhos se embaçaram pr’ás distâncias
a
alma bem mais perto está de Deus!...
Por
isso,
há
quanto tempo devo-te uma prece, meu patrão maior,
apesar
das lides, onde arrisco o couro e deixo meu suor
sobre
esses cavalos, cascos de tormenta e olhos de braseiro,
pois
neles, quinchei meu rancho de “cordas e puas”
escolhendo
a lua prá bem enfrená-los, serem meus parceiros!
Ah,
meu patrão velho,
desculpa
este índio de mãos calejadas
que
pediu “bolada” prá montar no pelo
o
flete mais xucro da tua invernada!
Sei,
me amadrinhaste
livrando
repechos, cercas e restingas
para
que eu sentisse toda a força bruta
do
lombo do tempo que, mouro –prateado
pinta
o meu retrato nálguma cacimba!...
Ah,
patrão,
mas
eu não me entrego e apesar da idade,
não
changueio penas nos galpões de estância,
nem
esmolo o pão, se não semeio o trigo!
Ainda
me seguro sobre esses ventenas
e,
na entressafra das domas, tropeio!...
Não
faltam pousadas aos que tem amigos!
Olha,
meu patrão!
Vês
esse guri de passo leviano, jeitão entonado
que
dardeja os olhos lá para a mangueira, a bombear os potros?
Esse,
é o meu filho, pois bem diz o ditado
“que
quem sai aos seus, não copia aos outros”!
Por
ele, te peço,
porque
nessas lides de arrocinar fletes
e
andejar nos bretes por a Deus dará,
cada
vez mais brabas são essas “rodadas”...
Cada
vez mais brutos tornam-se os anseios
prá
seus lindos sonhos, ainda de piá!
Olha
para nós
e,
acrescenta ao mate, em cada cambona
tisnada
das brasas, por esses fogões,
o
“juju” do amor a esses serviçais
que
não temem lérias desses bufarrões,
porque
se criaram prá amansar baguais!
Escuta,
patrão velho,
a
singela prece deste homem simples
-
olhos outonais e alma em primavera -
quase analfabeto das leis da cartilha,
mas que tem tropilhas de fé e esperança
já aquerenciadas em cada garupa desses
potros-feras!
Há
um guapo encanto
-
isto eu não te nego – quando o pé se estriba
a
tatear o loro e, as rédeas ponteadas
ganham
vida própria nesta mão esquerda!
Oigalê
fascínio quando um potro berra!
É
o vento que teima a destrançar a cerda!...
É
qual trovão a aflorar da terra!
Olha
para nós
rudes
pedras mouras, quando somos moços;
tigres
de coragem pr’á qualquer retouço,
não
importa a fama, raça ou seus matizes!
É
por esta honra que se arrisca o couro!...
Mas,
cá ficamos nós com as cicatrizes
e,
vão-se os cavalos para os matadores!
Ah,
meus belos fletes,
beija-flores
ágeis a trocarem cascos
no
sem-fim das léguas dessas pradarias,
como
quem andeja negaciando amores!
Olha
patrão velho
por
estes terrunhos, uno os companheiros!...
Nós
de olhos mansos e eles com braseiros!
Avoenga
herança... pingo e domadores!