TROPILHAS DE AFAGOS

                       Jurema Chaves

 

Amadrinhando a saudade
Vai a lembrança mais linda
Que guardo dentro de mim
Como esporas afiadas
Cortando gritos silentes
De ausências e desejos
Marcas do tempo no espaço
Que nos separa e nos une
Como um frêmito de amor

Nos campos do coração
Florescem sonhos, encantos
Que as vezes o desencanto
Faz o sereno do pranto
Nublar o vidro dos olhos
Onde os dedos da ternura
Moldaram a tua imagem
No pedestal do meu peito
Que, com o passar do tempo
Enraizou-se na alma

O destino, potro xucro
Que não respeita alambrados
Leva tudo pela frente
Só os sonhos ficam, insistentes
Levando a alma da gente
Num vôo além-olhar
Num ímpeto alucinado
Voando, paralisando
Buscando ninhos desfeitos
Colecionando momentos
Formando o livro da vida

São cicatrizes que ficam
Pelos caminhos da alma
Que a poeira da saudade
Vai cobrindo lentamente
O destino vai regendo
A tropilha já cansada
O olhar perdido, pra o nada
Na face, a marca dos tempos
Na voz, o som das distâncias
Mas no peito, a mesma ânsia
De andar, andar e andar
Sorvendo gotas que restam
De uma luz crepuscular

O tempo, contando as horas
Vai dividindo em espaços
E
no relógio do peito
Um tic-tac sem jeito
Querendo pedir-te ainda
O refúgio dos teus braços
Pra descansar minhas noites
Todas insones, que trago,
Na doce serenidade
Desses teus olhos profundos
Que trazem o encanto dos mundos
Em mil ternuras e afagos

Fui desfilando as lembranças
No corredor da memória
Via a aurora dos teus olhos
Tornando a vida mais vida
Num poncho ardente de anseios
Me embretei nos devaneios
E voltei no tempo, a sonhar
Tuas mãos dentro das minhas
Buscando o mesmo horizonte
Beijando o sol das manhãs
Como dádivas de Deus
Os teus dedos delicados
Bordavam juras, calados
Passeando dentro dos meus

Mas isso já faz tanto tempo
Que esqueci de contar
Quantos tentos de saudade
Já trancei com a solidão
Mesclas de risos e prantos
Que o tempo não apagou
Herança plena de afeto
Esse sublime dialeto
Que uniu nossas almas
Numa presilha de amor

E assim fui me dando conta
Que nos campos do esquecimento
Não consegui te deixar
Ainda busco teu rosto
Em cada rosto que vejo
Pois emponchaste meus desejos
Numa distância infinita
Num laço de amor tão forte
Que as lonjuras e ausências
Não conseguem destruir
Mas esqueci de esquecer-te
Porque não posso perder
Minha razão de sorrir

Não posso perder recuerdos
Matizes de primavera


Que deixaste para mim
Minha pandorga de vida
Solta o rumo dos ventos
Que as mãos não podem alcançar
Mas que nas asas do sonho
Busca teu riso de paz
Este poder infinito
Leva a nudez de meu grito
Pedindo que não te vás

Ao menos, não vá de todo
Retornes de quando em vez
Para
trazer-me um sorriso
Uma gota do teu olhar
E manter viva a esperança
Da minha alma criança
Que insiste em te procurar
Em acalmar esta ansiedade inquietante
De buscar-te, de reencontrar-me em ti
Em
um mundo de ternura
Que eu sei, existe
Nuns olhos morenos, tristes
Os mais lindos que já vi