SILHUETA DE UMA MULHER
ANTIGA (FORA DE SEU TEMPO)
Júlio César Paim
Às
vezes
Penso
que sou moça demais
Para
compreender o tempo.
Outras
vezes,
Tenho
a impressão de que meu tempo
Ainda
é um guri de calças curtas e suspensórios.
Não
sei se fui eu que nasci fora do tempo
Ou
se é meu tempo que anda meio fora de si.
Há
tardes
Que
carrego nas costas, um universo em paz,
Na
trouxa de roupa limpa, lavada na sanga
Que
nasceu dos meus olhos.
Há
noites
Que
sento à sombra da minha própria solidão,
E
ouço em ré menor, uma canção de amor maior,
Que
vem na voz rouca do vento.
E
faz meu coração bater em retirada
Rumo
a um olhar, amante da estrada
Que
traz em si o brilho dos meus olhos.
Há
manhãs
Que
paro diante ao espelho e me confundo com ele...
Estou
mais bonita, mais madura.
Pressinto
que alguém está para chegar
Mas
me sinto insegura: Quando será?
Serei
eu uma mulher prometida a espera de uma flor
Ou
apenas uma velha promessa de amor.
Há
dias
Em
que esqueço de que sei cantar, dançar, sorrir,
E
inventar um sonho antes de dormir.
Há
outros dias
Em
que me sinto senhora de si
Uma
ave sonora em silêncio,
Que
mora sozinha e nunca está só...
Muitas
vezes
Me
sinto um grãozinho de pó no olhar do tempo.
Estou
atrasando o movimento vertical e uniforme
Do
velho relógio de areia,
Agora
estático na parede do peito.
Resisto
a chuva, ao sol da solidão
Resisto
a força do pensamento, resisto a tudo,
Para
não me deixar levar na correnteza do rio
Que
é movimento, e passa sem parar para pensar
Nos
ensinamentos que o silêncio deixa
Nos
rastros do vento, a margem do tempo.
Nos
meus olhos nasce uma dúvida:
Quem
sou eu? Uma lágrima só ou uma alma avó?
Só
me encontro diante a imagem virtual do espelho.
O
brilho dos olhos de menina,
confunde-se
com a menina dos olhos.
Já
não sei qual das duas é mais bonita, a mais real...
Um
sorriso debutante tira uma lágrima pra dançar...
O
espelho é apenas a vista superior da lagoa, que se arrebata,
Vertical
– palco de prata para a dança dos olhos.
Primeiro,
ponho uma saia branca rodada.
Troco
por outra, macia e longa, de algodão.
Quem
sabe uma saia de linho ou de cetim? Não.
O
corpo de moça é velho demais para roupas tão novas.
Há
mulheres
Que
parecem estrelas, mas não são.
São
deusas, de carne e osso,
Que
tem sangue nas veias, os pés no chão.
E
que são capazes de amar sem ser amadas.
Eu?
Eu não tenho medo de ser condenada,
E
me deixar queimar nas chamas da paixão,
Para
ficar com saia de fogo tisnada,
Na
seda das labaredas do coração.
Mas
não queiram que eu me sinta bem,
Dentro
dessas roupas nada femininas, estilizadas,
Sem
estilo de época, apesar de modernas,
Que
me dão a nítida impressão,
que
a mulher de hoje não tem pernas.
Ou
será que é o tempo que anda mal de pernas
E
não tem mais tempo de voltar atrás?
Nas
grandes lojas de tecido
Encontro
apenas retalhos de verdade
E
velhos enganos vendidos em metro.
Peças
e peças de um mundo de mentira
Onde
a primeira vista sobra flor,
Mas
no fundo, falta amor.
De
outro lado do balcão
Alguém
vê uma aliança de fantasia na minha mão direita,
E
pergunta, sem muita calma,
quanto
eu preciso de tecido para ser feliz...
Mede-se
a altura, a cintura, o busto, os quadris,
Como
se fosse possível envolver num tecido qualquer,
Como
se houvesse uma fita métrica
capaz
de dar a dimensão exata da
Alma
da Mulher.
Talvez
eu tenha me apaixonado por um velho sonho
Ou
tenha ficado noiva de um tempo moço
Que
o romantismo criou, e o realismo calou.
Às
vezes
Penso
que sou moça demais para compreender o tempo...
Outras
vezes
Tenho a impressão de que
Meu
tempo ainda é um guri de calça curta e suspensório.
Já não sei se fui eu que nasci fora do tempo
Ou
se é o tempo que anda meio fora de si....