UMBU DE TAPERA

 Juca Ruivo (Jose da Silva Leal Filho)

 

Guitarreando a tradição crioula,

o pássaro bagual de topete colorado

escolheu para cancha a última forquilha

do umbu esguaritado,

da tapera carquincha.

 

Então, — quando o luzeiro se adelgaça,

sangrando o topo das coxilhas

e passa

um tição nas grotas e canhadas,

a guitarra campeira

começa a melodiar nas madrugadas,

a história da paragem:

 

Um Tuxava Charrua,

na última boleada do avestruz

bordara-lhe uma cruz,

na casca nua,

porfiando arremedar o signo dos Padres da Missão,

 

num vago entendimento

da imensa evastidão

do sonho Jesuíta...

 

Depois, um tapejara

rastreando um boi perdido,

a marca lhe riscara.

E um gaúcho afligido

por mal de mulher

como recuerdo amargo de esperança vaga,

gravou-lhe um coração

na ponta duma adaga.

 

E passaram os Pátrias,

peleando em repontes

caudilhos escapos,

gozando-lhe a sombra.

E lanceiros Farrapos,

alçando-se em pala, nos galhos frondosos,

bombearam sestrosos

confins de horizontes...

 

Carretas e tropas cruzaram de pouso,

deixando de rastro, chamuscos no tronco;

malevas e tauras na vida matreira,

campearam repouso

na mesma fogueira.

 

E coplas de ausência, em noites silentes

que o mesmo que a cinza o vento espalhou,

pontearam dolentes,

em dengues compassos;

 

e diz que uma feita dois Tebas gauchaços,

por ódios de sangue, jurados de morte,

tercearam a sorte

na mais buena Lei!

 

Egual que um testigo que nunca se abriu,

o umbu carcomido,

o abrigo reiúno,

calado, esquecido,

a tudo assistiu.

 

Assim,

a árvore caduca, a estátua do deserto,

é o livro da querência e sempre aberto,

escrito em cicatrizes.

E afrontando o presente, recordando o passado,

Minuanos, “mandados”, só folhas lhe expande;

 

porque tem as raízes

cravadas bem fundo na fé do Rio Grande!

e ali — num raiar de Outubro,

quando a madrugada cor de sangrador,

mal pegou tingir

do velho umbu, o derradeiro noque,

o pássaro trovador

corneteou que retiniu mui longe,

o último toque

de reunir...