O FORNEIRO E O PORTEIRÃO

Juarez Machado de Farias

 


O Forneiro,

pássaro pedreiro,

fez a proposta ao

porteirão;

 

“Ando em busca de um

lugar

que suporte o xucro

vento

pra que eu faça um

erguimento

do meu ranchito de barro.

Então, pensei no teu

mestre,

que é cambará - puro

cerno - e zomba das

intempéries

pois já varou tanto

inverno!...

 

“Em troca do território

que para mim arrendarás,

eu serei teu companheiro,

te devolvendo esta paz

- que nem sei se estás

lembrado - quando eras

tronco grosso,

trono de asa em alvoroço,

o rei do mato fechado!

 

“Cada aurora e a cada

hora,

se alguém retinir a espora,

tirando a alça da tranca,

eu chegarei frente à porta

- junto com minha

parceira - dizendo aos

que te escancaram,

que teus olhos não

fecharam,

e não és madeira morta!

 

“Direi a todos - num

gesto - que bendigo a

vocação de quem se fez

abertura como a tua,

Porteirão!

Que quando o fio do

machado te avistou,

ensangüentado,

não creu que fosses te

erguer - tão bela

ressurreição!...

 

“Os meus filhos

emplumados,

quando já emancipados

para os domínios do céu,

vão alardear tua

imponência!

 

Que foi cá - do teu

chapéu - o primeiro vôo

da vida, abrindo estradas

ao léu!...

 

O Porteirão - que é

fronteira entre o campo

e a poeira, entre o adeus

e a chegada - respondeu

para o Forneiro...

 

“Falaste que sou altivo:

porém não acho motivo

pra rir do gado que passa,

do terneiro que não acha

minha boca  escancarada

e pecha no trameirio.

Só lembra do Porteirão

quem, há pouquito, me

abriu.

 

“Da estrada, só ganho o

pó, jamais o “buenas” do

andante. Já fui copa

verdejante, hoje eu estou

mutilado. Nasci do fio do

machado e das mãos do

alambrador. Sou planta

que não dá mais flor, sou

escravo do alambrado! ...

 

“Eu vivo cravado e só,

e foste tu, bom Forneiro,

o meu consolo primeiro

- quando me ergueram

aqui!...

Pensei: “Não posso florir,

do mato vivo apartado.

Mas, se o teu rancho

barreado brotar no topo

de mim, terei, ao menos,

saudade e a ilusão de não

ter fim...”