O FILHO VARÃO

José Luis Flores Moró

 

Quando os primeiros fios de barba me mancharam o rosto

E a pompa de ser homem deu-me asas

No nômade motriz dos meus sentidos,

Parti do rancho ninho dos meus pais

Para a odisséia homérica

De me tentar ser eu!

 

Os corredores me apontavam como setas

Os horizontes que enxerguei por rumo

E a cada passo em que perdia o prumo,

Eu colecionava enciclopédias para as metas!

 

A saudade dos grilhões divinos

Que me abraçavam no calor materno

Aquietou-se no frenesi de enlevo

Que os olhos lindos de uma campesina

Lançou qual boleadeiras perfumadas

Nas patas largas do meu ir teatino!

 

Juntou sorrisos em trouxas de carinho

E fez partições com meus andares nômades!

 

Meu joão-de-barro foi fazer o rancho...

A parede barreada... Pau-a-pique...

Tabatinga sovada sob os pés...

O sonho inefável de parir família

Exauria-se e renovava-se a cada afago

Nas lãs macias do pelego lânguido

Que o suar banhava nas noitadas quentes!

 

Ah! Quanta ternura quando um ventre avulta

Trazendo à tona um pedaço da gente!

Quanta euforia na expressão inocente

De se dividir para tornar-se outro,

E de imaginar para o formar de um filho

A mesma liberdade e o mesmo brilho

Do céu azul que tem no olhar do potro!

 

Haveria de ser macho, como eu!

O primogênito tem de ser varão!

 

A intrepidez e o caráter vêm do gene,

Mas as manhas e a destreza eu ensino.

Será gaúcho guapo esse menino,

Pois a fruta rente ao pé, deveras, cai!

Será um taura... Não será maleva...

Pois eu sei que o piá eternamente leva

As coisas “buenas” que aprender com o pai!

 

Meu primeiro presente – Uma bombacha

E uma camisa de brim com mangas longas

Que ele haveria de “arremangar” nas tardes quentes

Em busca dos preás pelos banhados!

Depois... Um petiço patas brancas

Que o levaria, no tapete desses campos,

A conhecer os infinitos do campeiro

Para a epopéia feliz da sua infância!

 

Quando o setembro prenunciou rebentos

Na aquarela magistral da primavera

A dor no ventre converteu-se em amores

E o cálice da flor abriu-se em fruto

Para a metamorfose incrível do meu ego!

 

Haveria de surgir o meu varão...

 

Ah! Sina maleva de criar visões

E expectativas pra enfurnar nos sonhos!

Nós mesmos criamos as pedras para os muros

E o nosso sol que, às vezes, fica escuro,

É porque imaginamos que sempre será dia!

Não damos ênfase ao oposto, ao casual,

Não sabemos discernir o bem e o mal

Que a natureza mãe nos propicia!

 

Aquele chorinho em frenesi de vida

Nos braços da mãe, pedindo o seio,

Não me lembrou que era um macho que eu queria!

E a sua fragilidade linda me dizia

Que eu era o seu papai e ela minha filha!

Só quando a tive carente nos meus braços

E a envolvi nos grilhões dos meus abraços

Eu tive concepção do que é família!

 

Essa prendinha renovou meus sonhos,

Agora mais concretos... Mais reais...

E da vez que eu penso o meu varão querido

Já não mais choro e me entristeço mais!

 

Já a vejo numa eterna primavera

Esvoaçando as tranças nas corridas,

Atrás das borboletas coloridas,

Com a boneca de pano junto ao seio!

“Gracias” Senhor!  Pela menina que me deste,

E pela forma divina em que fizeste

Eu esquecer o piazito que não veio!

 

Plantei meu pólen na flor

De uma roseira mimosa

E vi brotar, com terno amor,

Meu primeiro botão de rosa!

 

“Gracias” Senhor!