EU VI
José Luis Flores Moró
Eu vi
Que tinham me visto
E que riam das pilchas que visto
Dia desses, na cidade...
Senti-me tão diferente,
De outro mundo ou continente
Que, embora discretamente,
Tive vergonha de mim!
Que estranho!
Nem "buenos dias"
Ouvi de um lábio sequer.
Entre o homem e a mulher
Quase não vi diferenças;
Os olhos desgovernados
Buscavam em rumos parados
A fuga pras próprias crenças!
Qual amontoado de parias
Tropeçando os próprios passos
Nos intuitos de onde ir,
Esses robôs indecisos
Não esboçavam sorrisos
Por não buscarem motivos
Ou não saberem sorrir!
Por certo era eu o estranho,
O objeto pesquisado,
O caso mais complicado
No rol da psiquiatria
Como se a psicologia
Explicasse pra razão
Que esse mundo virtual
Não considera normal
Quem cultua a tradição
Mas... caramba!
Senti-me
Tão diferente,
De outro mundo ou continente
Que, embora discretamente,
Tive vergonha de mim!
Porém... eu sei
Nos meus conceitos
De rude filosofia
Que essa atônita euforia
De eletro-modernidade
Entre o motor e a fumaça,
Aparentemente disfarça
Como uma enorme mordaça
É os gritos dessa cidade!
Pois essa gente não sabe
Que esse mundo cibernético
Sem tons e acordes poéticos
Nasceu de patas e pilchas
Que o campeiro nos legou,
E que na minha indumentária
De um estranho personagem,
Apenas presto homenagem
Às origens que nos formou!
O mapa que foi moldado
Por nossos antepassados,
Embora já amarelado
Na solidão dos museus,
Registra pra mocidade
Que as pedras dessa cidade
Nos topos do arranha-céu,
Foram erguidas lentamente
Por um ser também diferente
De bombacha, botas e chapéu!
Mas... Senti-me
Tão diferente,
De outro mundo ou continente
Que, embora discretamente,
Tive vergonha de mim!
E por isso
Eu peço perdão
Ao Senhor, nosso Patrão
De não haver percebido
Que quem zombava comigo
Por me ver assim vestido
Também sentia vergonha
De, sem fé e identidade,
Não encontrar na cidade
O mundo perfeito que sonha!