O APITO DO TREM
José Machado Leal
A coisa mais linda
que Deus pôs na terra,
mais linda que o canto
das aves campeiras
no verde do mundo,
mais linda que o pingo
do orvalho caindo
dos pastos que choram,
mais linda que a voz
das aves-marias
nos sinos festivos
que lembram Bélem.
A coisa mais linda
que Deus pôs na terra:
-o apito do trem.
Eu era criança,
queria o apito
do trem que corria,
buscava no chão
pedaços de som
que o trem apitando.
Deixava cair.
Achava carvões
e brasas morrendo
e a cinza inda quente
e os trilhos tremendo
zombavam de alguém
que nunca acharia
pedaços do som
do apito do trem.
Eu ouço na curva
da estrada do ontem
o silvo pungente
do trem que passou
e nem a fumaça
se deita nas várzeas
fazendo rebanhos.
Ficou a saudade
contando dormentes,
boeiros e pontes
que escondem segredos.
E a criança que fui
procura , também,
a coisa meis linda
que Deus pôs na terra:
-o apito do trem.
Estamos chegando
no horário do fim.
Não tenho mais trilhos,
nos campos abertos,
nem postes correndo
na minha janela.
A vida é um vagão
e eu sou o passageiro
e desce, comigo
na minha bagagem,
ou nesta parada
ou outra que vem,
a coisa mais triste
que Deus pôs na terra:
-a agonia do som
do apito do trem!