NO TEMPO DOS PAIS
José Machado Leal
Se ainda hoje me levanto
cedo,
é um costume que me vem da infância.
No terceiro canto do galo
mestre,
salto e vou direito ao fogão de lenha
e acendo o fogo, antes que aurora venha,
pego palha de milho no galpão
e co'a xerenga
bem afiada na mão,
eu fecho um palheiro de fumo-em-rama,
chamo, então meu pai, que ainda está na cama
que pergunta...Tá pronto o
chimarrão?
Foi assim, cedito, que entrei na lida,
pisando o barro do meu chão guará,
juntando cacos dessa história bugra.
Pra ser o mesmo, nem amarro o
cacho,
são os sogaços que
"enrijece" o macho.
Provei do espinho à flor do
mal-me-quer,
sempre no prumo pro que der e vier,
honrando a herança desta mescla crua
de lusitano, guarani, charrua,
seguindo rumos que meu Deus quiser.
Ainda não sei bem se sou
gente ou terra,
pois se agita em mim um calor de brasa,
não sei se é a lava de um vulcão que dorme,
ou se é o fervor do sangue engrossando as veias,
qual potro indomado a patear
areias.
Sei, apenas, que estou aqui a
serviço
e não vim para correr petiço.
É preciso que se arrebanhe o
lote
que se perdeu e que se afirme o trote.
Nenhum de nós deve ficar
omisso!
O brado de Sepé ainda ecoa
no badalar dos sinos, nas cantatas,
nos hinos, nas trovas de amor terrunho.
Pois ficou nas almas, ficou
na terra,
cavalgou no vento, instigou a guerra,
agitou os ermos, num bater-de-guampas,
deu ao Gaúcho essa guapa estampa
e fez da querência este pago santo.
Pras invernias, o sagrado manto
de "Monarca das Coxilhas e do Pampa".
Não basta que eu exalte a
descendência,
hai que ser
autêntico e dar exemplos,
revolver as cinzas, as pragas, o esterco
recriar, refazer e replantar,
para que se possa, denovo amar.
Cuidar da família e cuidar do
pago !
Só quem dá carinho, recebe
afago!
Quero para os meus, uma pátria
séria
sem falácias, sem fome, sem miséria.
-Só peço a Deus, desse licor,
um trago.
Para os avós e os pais, minha
saudade.
Desbravadores guapos, que os pecados
já foram perdoados, talvez, em vida,
pelo trabalho, pelo suor e o pranto.
Que o Pai Divino lhes estenda
o manto,
dê-lhes pátria, sem apartar ninguém.
E quando chegar nossa vez,
também,
tenhamos ranchos com estrelas no teto,
sol e lua, sombra, água fresca, afeto
e todos juntos, na estância do além.