A
gurizada do meu tempo atava
Bois
de sabugo às caixas de sapatos
Para
eternizar os eternos viajantes quixotes.
Cruzavam
nas cercanias do povoado
Ou
a frente das portas dos ranchos da vila,
Para
despejar quinquilharias, leitões
Panelas,
peneiras de palha e até frutas
Que
a intempérie do sul não judiou.
Os
homens desse tempo,
Esses
que cruzavam
Aguilhada
em riste,
Traziam
semblantes finos,
Carregados
de saudades e esperanças.
Ostentavam
a dinastia carreteira
Que
foi misturando sangues
Desde
a invenção da roda,
Essa
que é serventia das cambotas.
...
de lá para cá foram escasseando...
esta
lenta obsolência os foi engolindo...
mas,
para os poucos restantes,
já
ter carreteado é um atributo
de
brava nobreza crioula.
A
chuva e o mormaço temperava
A
alma de coragem e paciência,
Formando
sábios laboriosos,
Transponentes
de léguas de solidão.
As
carretas lembrando o poeta,
Pareciam
caravelas singrando mares,
Abrindo
pastos no verdor dos campos,
Na
mais simples das analogias.
Vinham
quinchados de santa-fé,
Em
couro ou até de zinco toldadas
Faziam
as vezes de paiol e prefeitura,
Carro
de defunto e casa de família,
Farmácia
de remédios e bolicho
Ou
até não raro oratório ou prostíbulo.
Então
revendo a história,
Desde
os tempos de garibaldi,
Que
arrastou em duas carretas,
Puxadas
por duzentos bois,
Dois
lanchões desde a lagoa dos patos
Até
a lagoa do rio tramandaí,
Podemos
dizer que esses quixotes
São
cavaleiros da távola redonda
Peleando
sempre de peito franco.
Com
seus ponchos ao vento
Guri,
que é grumete, e o cusco,
Perdidos
na neblina dos tempos,
São
os fiéis depositários das estradas
E
desse transporte que sucumbiu
Porém,
com obscura consciência,
Carregam
no sangue a vanguarda
De
ideologia e de pleno heroísmo
Que
herdaram os ancestrais.
Ainda
lembrar dos remotos,
Quando
dizia-se a boca cheia,
Que
moço com uma carreta
E
quatro juntas bem parelhas,
Já
podia casar e ter família.
Trazem
os causo de bolicho,
Das
voltas de mate ao pé do fogo
E
enxergam, por vezes, fantasmas
No
literal chiar das cambonas
Por
isso, que, quando volto no tempo
No
tempo de piá, de faz de conta -
Lembro
deles, uns três ou quatro,
Solidários,
educados e amenos,
Passando
uma vez em cada mês,
Gritões
para as suas oferendas
Mas
calmos e pausados nas falas
Quando
as “donas” das janelas
Ou
dos parapeitos, negociavam...
Não
é a toa, que, varando jornadas
Tragam
conforto nessas penosas viagens
Talvez
busquem na epopéia das carretas
Motivos
bastante para retornar
Quem
sabe mostrem nos olhos marejados
A
independência de códigos e posturas
E
que se entenda em todos os quadrantes,
Que
foi em carreta de boi, por terra
Que
a humanidade foi crescendo.
Por
isso, hoje, quando vejo esses poucos,
Tranco
lento, às beiras da sociedade,
Percebo
no seu íntimo mais profundo,
Quando
algum menos informado
Cria
coragem para interromper
A
jornada e lhes pergunta incauto.
Por
que não trocam seu obsoleto
Meio
de transporte por algo melhor,
O porque
da perseverança infinda.
Eles
se recusam por razões claras
Talvez
pelo orgulho de controlar,
Plenamente
seu modesto ciclo de vida
Por
isso, nessas oportunidades,
Quando
são parados pelas ruas
E
essas perguntas insensatas
São
feitas, educada e dignamente,
Quebram
o espelho das retinas
Baixam
a cabeça e nem respondem.
...
com suas naus preguiçosas,
gemidos
dolentes e rastros compridos...
austeramente
seguem em frente...
e,
os que ficam com suas indagações
sem
serventia e sem respostas,
deveriam
saber que eram inoportunas
e,
pelo desagravo, seria providente
desculpar-se
pelo inconveniente
ou
envergonhar-se de ter perguntado.