MEU VELHO GALPÃO

João Freitas

 

Meu velho galpão querido

Que o tempo conservou

E no Rio Grande ficou

Para lembrar o passado

É um palanque cravado

Embelezando a paisagem

Hoje me serve de tema

Que da memória reponto

O que nestes versos, conto

Vai pra ti minha homenagem

 

Eu nasci no campo verde

Ali na encosta do morro

Ouvindo o tropel do sorro

Pras bandas do banhadão

Pra esquerda tinha um capão

De puro angico e camboim

A direita a velha sanga

E bem na frente a lagoa

Saudades da vida boa

Que não volta mais pra mim.

 

Não agüentando a saudade

Voltei te ver novamente

E aqui estamos frente a frente

Meu Galpão velho de cerno

Não nasceu pra ser moderno

Que o mundo todo compreenda

Nasceu pra ser o abrigo

Do autêntico gaúcho

Que não te troco por luxo

Da sala de uma fazenda.

 

Este esteio bem no meio

Eu me lembro, e hoje falo

Onde amarrava o cavalo

Meu pingo de estimação

Fazia o fogo de chão

Com guarde-fogo de arrueira

Uma tarimba bem grande

Nela estendia um pelego

Para ter o meu sossego

Depois da lida campeira.

 

Até parece mentira

Galpão velho esburacado

Te deixaram desprezado

Solito qui neste mato

Hoje és abrigo de rato

De cobra ou de alguma fera

E muitos ainda dizem

Que és resto do passado

E por ser mal assombrado

Foi que ficaste tapera.

 

O olho d’agua está sujo

Coberto de matagal

O velho cocho do sal

Também já apodreceu

Um dos culpados fui eu

Te deixar na solidão

Mas se pudesse eu voltava

Te habitava novamente

Jamais viveria ausente

De ti querido galpão.

 

Hoje tão longe de ti

Embretado na cidade

Quase morro de saudade

Quando em você estou pensando

As vezes durmo sonhando

Tão triste nesta distância

Eu sempre virei te ver

Meu velho galpão querido

Jamais será esquecido

Meu velho abrigo da infância.

 

Hoje só te resta um dono

Que ficou de peão caseiro

O João de barro hospitaleiro

Que está sempre te rondando

Dia e noite te cuidando

Como um amigo de fé

Quando cheguei me pareceu

Que disse o velho barreiro

Boleia a perna parceiro

Que o galpão está de pé.


 

Vejo ainda as curucacas

E o casal de quero-queros

Amigos leais e sinceros

Que me acordavam aos gritos

A farra dos periquitos

Voando daqui pra li

A emoção me toma conta

Sinto meu peito sangrando

E fico me perguntando

Por que me fui daqui.

 

Lembro teu terreiro grande

Sempre limpo e bem varrido

Hoje sujo e destruído

Os arvoredos secaram

Até as abelhas voaram

Te desprezando caudilho

Parece até que me olhas

E me fala comovente

Eu estou muito contente

Porque voltaste, meu filho.

 

E já me vou, meu galpão

Mas eu te dói garantia

Que farei na poesia

Ema homenagem especial

Tu foi meu berço bagual

Colégio de formação

E quando a morte vier

Deixo um pedido gravado

Eu quero ser enterrado

Perto de ti meu galpão.

 

Galpão velho me despeço

Pois eu sei que não reclama

O compromisso me chama

Pois eu tenho que voltar

Mas volto te visitar

Se Deus me der permissão

É em ti que eu vejo tudo

Por onde quer que eu ande

É um pedaço do Rio Grande

Querido e velho galpão.