VERANEIO DE UM GAÚCHO

João Batista de Oliveira Gomes

 

Se eu contar pra vocês

Vão dar risada à vontade,

Vejam que barbaridade

Tudo o que me aconteceu,

Não é que um amigo meu

Filho da D. Zoraia,

Me convidou pra ir com ele

Passar uns dias na praia.

 

Desconfiado e contra a vontade

Mas fui topando a parada,

E já de bagagem arrumada

Perguntei pro meu amigo,

Será que não tem perigo

Tu sabes que levo medo,

Me disse: tu vais gostar bastanre

E saímos de manhã cedo.

 

De fato chegamos lá

Tava grande o movimento,

Eu cheio de contentamento

ìndio velho sem retovo,

Tinha comprado um traje novo

Bem no início do ano,

E de chapéu, lenço e guaiaca

E bombacha de dois panos.

 

Pois bem, assim é que fui

Trajadão dessa maneira,

Pois era a vez primeira

Que isso me acontecia,

Te juro que não sabia

E tava mal informado,

Nunca pensei que na praia

Se andavam quase pelado.

 

Chateado e meio sem jeito

Me entreverei no povaréu,

Pois tapeei o meu chapéu

E arrastando a minha alpargata,

Me aproximei de uma mulata

Nunca vista linda assim,

Só que ele foi dando no pé

E saiu rindo de mim.

 

E o pessoal todo me olhavam

Pela minha maneira de andar,

Mas eu sempre querendo chegar

Bem perto da mulherada,

Mas de mim davam risada

Mas este índio se esculacha,

Nunca vi dizer que alguém

Tomasse banho de bombacha.

 

Mas apelei pro meu amigo

Que só queria gozação,

Não quis me emprestar um calção

E me insistia pra ir ao banho,

Achei ruim, achei estranho

Mas eu que sou pronto pra tudo,

Chegamos até a beira d'água

E me atraquei de roupa e tudo.

 

Assim que entramos na água

Vinha uma onda roncando,

Eu já fui me apavorando

E já me pegou de mau jeito,

Me deu um guascaço no peito

Oigatê queda bem feia,

Pois rolei uns trinta metros

E fiquei coberto de areia.

 

levantei dali meio tonto

E comecei a embrabar,

Deste jeito não vai dar

Pois não é gozando comigo,

Parece até um castigo

O que está me acontecendo,

Pois nada tem dado certo

Até salmoura estou bebendo.

 

De tão brabo que fiquei

Resolvi tomar outra atitude,

Tomara que Deus me ajude

E que agora dê tudo certo,

Dizem que tem loja aí por perto

Pois vou entrar porta adentro,

Vou comprar um traje de banho

Do bem bom cem por cento.

 

Nem foi preciso andar muito

QWuando eu vi numa esquina,

Um lojão de coisas finas

E um moço muito faceiro,

Eu falei pra ele ligeiro

Vê umas coisas pra mim,

Mas o moço nem se mexeu

Pois era um tal de manequim.

 

De novo outra embretada

Quase perdi o rebolado,

Mas dei uma olhada pros lados

Vou contar a situação,

Me encostei lá no balcão

E logo já fui pedindo,

Quero um traje bem igual

Ao que o moço está vestindo.

 

E a moça que atendia

Por sinal muito educada,

Mocinha desembaraçada

Perguntou se eu era turista,

Respondi não uso roupa de lista

Não sei se a moça entendeu,

Quero uma cor mais consoante

Pra um índio que nem eu.

 

Me trouxe um azul bonito

Pois daí fiquei faceiro,

Mandou que provasse primeiro

Pra ver se esse lhe agrada,

Vesti aquela coisa esticada

Mas assim eu não agüento,

Pois isso nem bolso tem

Pra guardar meus documentos.

 

Vejam só o que eu passei

Por falta de orientação,

Mas até gostei da lição

Apesar do que sofri,

Pois muita coisa aprendi

Já estava me acostumando,

Andar de calção bem curtinho

O lombo já relampeando.

 

Essa estória que contei

Muita gente não acredita,

Pois é mesmo esquisita

E cheia de complicação,

Mas aconteceu com este peão

Vindo pouco da campanha,

E ao chegar na cidade

Quanta coisa a gente estranha.

 

Eu vou deixar um conselho

Para muitos amigos meus,

Que não façam que nem eu

Na ilusão da cidade,

Um peão sofre barbaridade

E no verão a coisa muda,

Todo mundo de calça curta

E dizem que tão usando bermuda.

 

Mas eu quero voltar na praia

E já estou preparado,

Quero tirar o atrasado

E mostrar que o índio mudou,

Quem eu era e quem eu sou

Pois agora estou que é um perigo,

E a mulata que riu de mim

Por Deus que trago comigo.