SENTIMENTO DE UM PEÃO

João Batista de Oliveira Gomes

 

Sou gaudério meio xucro

Fui criado ao Deus dará.

Na brincadeira sou piá

Porque tive pouca infância,

Sou brinquedo de criança

Que nada entende da vida,

Sou encontro da peonada

Depois de um dia de lida.

 

Sou galpão de pau-a-pique

Sou velho fogo de chão,

Sou a cuia de chimarrão

Do porongo casco grosso,

Sou o lenço de pescoço

Seja branco ou colorado,

Que todo o gaúcho usa

Em seu pescoço amarrado.

 

Na campanha sou peão

Pra qualquer lida campeira,

Sou apartador na mangueira

Em dia de marcação,

Sou o potro redomão

Que recém foi enfrenado,

Sou o laço de doze braças

De quatro tentos trançados.

 

Sou o forte vento Minuano

Que sopra lá na coxilha,

Sou o sentinela farroupilha

Que tem o ferrão na asa,

Quando voa sobre a casa

Está anunciando visita.

Sou a velha superstição,

Que muita gente acredita.

 

Eu sou aquele tropeiro

Que levava a tropa por terra,

Sou a saudade que encerra

O velho tempo passado.

Da carreta sou o rodado

Da espora sou a roseta,

Sou a água sempre chiando

Na velha cambona preta.

 

Sou o tição guarda fogo

Que mantém acesa a brasa,

Sou a sombra de oitão de casa

Cozinha de chão batido,

Um velho sovéu torcido

O palanque falquejado,

Ficando em frente do rancho

Tira teima de aporreado.

 

Sou semente de tudo isso,

Que a tempo alguém semeou

E nasceu, se enraizou

E muito fruto tem dado,

Eu sou aquele soldado

Que muito lutou na guerra,

Sou o tinido das espadas

Dos defensores da terra.

 

Sou festa, sou rodeio

Sou fandango de galpão,

Sou a pura tradição

Que se cultua nesse pago,

Por isso tomo o meu trago

Sem precisar que me mande,

Sou gaúcho, e me orgulho

Ser crioulo do Rio Grande.

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