ÚLTIMO BOCHINCHO

Jayme Caetano Braun

 

A de oito baixos roncava

e o candeeiro estremecia!

nem o tinhoso sabia

do beleléu que se armava!

a cordeona resmungava

e parou de sopetão,

quando levei um cartão

da china que negaceava!

 

Levantou cinza com poeira,

quando cortei a cordeona,

bem pelo meio a chorona,

ao correr da carneadeira!

parou - de repente a zoeira,

ficou só o ar fumacento

e o meu arrependimento,

pra durar a vida inteira!

 

Cortar uma gaita em duas!

- só por capricho! um pecado!

o velho órgão sagrado

das nossas missas charruas!

quantas pragas de chiruas

com desaforos malucos

e relampear de trabucos,

tinir de adagas e puas!

 

pra descrever o brinquedo,

isso não é bem assim,

no bárbaro retintin,

onde não vale segredo!

ali o índio que tem medo,

nem que não queira se entangue,

sentindo o cheiro de sangue

e o choro do chinaredo!

 

O que não viu - ficou vendo,

o resultado do talho,

como quem corta um baralho,

num jogo em que está perdendo,

foi como um chiado fervendo

num olheiro de formiga.

Quem não tem nada com a briga,

peleia se defendendo.

 

Senti na testa um chispaço

que pegou de refilão!

um estouro de facão,

quase me troncheia um braço,

mas alarguei meu espaço

de costas contra a parede.

Um pardo veio com sede,

lo desguampei de um planaço!

 

Num medonho solavanco,

perdeu pé a bugra Raimunda;

larguei um pardo cacunda

e outro meio lonanco.

O gaiteiro - atrás dum banco,

benzido - à moda gaúcha,

contra bala de garrucha

e folha de ferro branco!

 

Depois de tudo acabado,

isso foi lá pelas tantas,

lombos cortados - gargantas

e bugre descaderado,

sangue fresco misturado

com gordura de candeeiro,

mas - saiu limpo o gaiteiro:

- o tocador é sagrado!

 

Quando veio o comissário,

pra resolver os assuntos,

pra encomendar os defuntos,

veio também o vigário;

inda hoje o vizindário,

quando lembra se arrepia.

Nunca mais - desde esse dia,

festejei aniversário!

 

E a china?-não sei da china,

pronde foi - nem donde veio,

lambe sal nalgum rodeio,

da pampa continentina,

cortando talvez a clina,

nas minguantes de setembro.

Por castigo - inda me lembro,

daquela maula brasina!