TRÊS MARIAS
Jayme Caetano Braun
Velha relíquia gaúcha
De pedras acolheradas,
Três chinocas
encapadas
Que rasgando um mundo novo
Perpetuaram no retovo
E nas cordas resistentes
As três raças diferentes
Que formaram nosso povo.
Retovada em couro bruto
Nas tabas e tolderias
Nascestes das correrias
De charruas e minuanos
Até que os rudes paisanos
Aprenderam a manejar-te
Te fizeram nobre parte
Dos apetrechos pampeanos.
Daí seguiste andarenga
A evolução campesina
Nas lutas da Cisplatina,
Nas invasões espanholas,
Onde caudilhos pacholas,
No fragor das tropelias,
Te chamaram Três Marias
Boleadeiras ou par de bolas.
Diz a lenda-
que um cacique,
Ao voltar de uma peleia,
Vendo perto a lua cheia
Que se destapava inteira,
Na ingenuidade campeira
Da supertição
charrua,
Resolveu domar a lua
E atirou-lhe a boleadeira.
Desde então-
no céu do pago
Daquelas
pedra bravias,
Surgiram as Três Marias
No meio dum fogaréu
E tropereando
a lo léo,
Sempre no rastro da lua
A boleadeira
charrua
Nunca mais voltou do céu.
Essa é a lenda – Mas a
história
Desse traste de galpão
É a da própria tradição
Das três pátrias campechanas,
As três Querências hermanas
Traços do mesmo debuxo,
Que moldaram o gaúcho
Nas pampas americanas.
Boleadeira de uma pedra,
E mais adeate,
de duas,
Três Marias
dos Charruas,
Dos andejos e teatinos,
Riograndenses e Platinos,
Centauros da mesma glória
Que amanheceram, na história
Boleando os mesmos destinos.
Boleadeira do Rio Grande
Que recebemos de herança,
Volto aos tempos de criança
E até lágrimas enxugo
Tropeio- Aparto- Refugo,
Na sombra do arvoredo,
Onde conheci o segredo
Das três pedras de sabugo.
Muitas vezes te larguei.
Saindo meio de enfiada,
No rei pastor da manada,
Bem sobre o meio das cruz
Ou num lombo de avestruz.
Desses que sai corcoveando
Pra rodas-
se desasando
Num campo de tacurus.
Mas hoje-
eu compreendo, ao ver-te
Dependurada num gancho
Olhando a porta do rancho
E ouvindo o berro dos bois,
Que já não temos depois,
Chegamos ao fim da lida:
-Boleamos tanto na vida
e a vida boleou nós dois.