MATE DOCE

Jayme Caetano Bran

 

 

Não há, na austera imponência,

Da vivência campesina

Estampa mais feminina

Que esse mate, flor de essência,

Doce, que amarga na ausência,

E se evola na fumaça.

E vai roubando, onde passa,

No recesso das querências,

As mimosas confidências

Da gauchinha lindaça.

 

De porongo ou porcelana,

De preferência pequena,

É a cuia que mão morena

Palmeia em prece pampeana

É de prata Boliviana

A bomba, é de ouro maciço,

É a chupeta e é por isso,

Pelo menos é uma crença.

Que ela não transmite doença,

Nem quebranto, nem feitiço.

 

Mate doce, de água ou leite,

Com erva-doce ou canela,

Não há no pago, donzela,

Que não te sinta o deleite

E que embora nem suspeite,

Porque foi ou porque fosse,

Vê, no que não realizou-se

Nos sonhos da sua vida

A lembrança indefinida

Do teu beijo, mate doce.

 

Mate doce da siá dona

Que por causa de um cambicho

Pra não ceder a um capricho

Conservou-se solteirona

E hoje chora e se emociona,

Na mais negra nostalgia,

Lembrando o sem serventia

Que aproveitando uma potra,

Lá se foi viver com outra

No rancho que ela queria.

 

Mate que em tarde chuvosa

Tem a freqüência de um rito.

Mesclado com bolo frito

E com leite da barrosa.

Mate que a prenda mimosa

Que foi menina e cresceu,

Flor do pago onde nasceu,

Sorve entre alegre e tristonha

E comendo sonho, sonha,

Um sonho que será seu.

 

Mate doce das vovós

Que passaram tantas coisas,

Mate doce das esposas,

Que, um dia ficaram sós,

E que perderam a voz

Dos risos e as alegrias.

Mate doce das titias

Que escaparam das mangueadas

E te sorvem extasiadas

Na lembrança de outros dias.

 

Mate que enfeita legendas

De amores correspondidos

E romances proibidos

Nos ranchos e nas fazendas.

Mates que as mimosas prendas

Beijam com lábios morenos

Sorvendo em tragos pequenos

O doce que se derrama

Por saber que, pra quem ama,

Uma saudade é o de menos.

 

Mate dos apaixonados

Que te adoram e apreciam,

Mate onde se acariciam

Mil dedos entrelaçados,

Parceiros dos namorados,

Mate que é mais que desejo

Porque traduz caprichoso

O pretexto mais gostoso

De se beija outro beijo.

 

Quanto a mim, mate divino,

Inspirados de cantores,

Foste, o filtro dos amores,

Que enfeitiçou meu destino

Pois este andejo teatino,

Ao sorver-se a vez primeira,

Se adonou dessa maneira,

Deus permita que isso fosse,

Da que achou o mate doce,

Minha doce companheira.